Guerras Híbridas: das revoluções coloridas aos golpes

Autor: Andrew Korybko
Editora: Expressão Popular
Ano: 2019

O Mérito Supremo consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar. Sun Tsu (Filósofo e estrategista militar chinês, 2000 anos Antes de Cristo)

Um dos maiores fenômenos contemporâneos encontra-se ancorado na geopolítica militar global: são as Guerras Híbridas. Trata-se da arte de desestabilizar os Países por meio de  recurso no qual  as intervenções militares encontram-se situadas em segundo plano e são substituídas por tempestades de insatisfações difusas.

Assim foram as chamadas Revoluções Coloridas, que aconteceram no Oriente Médio, onde as estruturas governamentais e estatais acabaram destroçadas pela ação dirigida por uma grande potência sem necessariamente a presença de forças armadas invasoras.

A literatura sobre as Guerras Híbridas e as Revoluções Coloridas já é bastante vasta para quem deseja melhor se informar sobre como realmente funciona, nos dias atuais, a política influenciada pela geopolítica, as chamadas guerras assimétricas, as tempestades coloridas e difusas, que nos atingem quase que diariamente, com o objetivo diversionista e de manipulação em larga escala da opinião pública.

Assim é que foi lançado no Brasil, em 2018, o livro Guerras Híbridas, das revoluções coloridas aos golpes,  do jornalista russo Andrew Korybko, analista político e conselheiro do Institute for Strategic Studies and Predictis.

Segundo o autor, Guerra Híbrida, como estratégia, é o caos administrado, cujo objetivo maior é o caos sistêmico em um determinado País, região ou mesmo continente, quando se fizer necessário.

Segundo o Conselho de Inteligência Nacional dos EUA, em 2012, o país estaria “pela primeira vez entre iguais”, ou seja, em um mundo multipolar, sendo, portanto, muito difícil empregar o unilateralismo agressivo usual, o que deu início ao impulso adicional para a implantação das lideranças “veladas” no planejamento militar estratégico geral norte-americano.

O então presidente Barack Obama, afirma Andrew, institucionalizou esse modelo de “liderança velada” quando discursou em West Point em maio de 2014. No discurso declarou com ênfase: “os EUA devem liderar no cenário mundial, mas a ação militar dos EUA não pode ser o único, ou sequer o principal componente da nossa liderança em todas as ocasiões.” E acrescentou: “Só porque temos o melhor martelo não significa que todo o problema é um prego”.

A essas alturas, afirma o autor, percebe-se que os Estados Unidos expuseram claramente suas intenções de trocar o posto de polícia do mundo pelo manto de mestre das marionetes das “lideranças veladas”, que consiste na sua adaptação à nova realidade no atual mundo multipolar.

Nesse quadro, segundo Andrew, os estrategistas geopolíticos norte-americanos definem como organizações de vanguarda as ONGs, usadas para  implantação de garantia dos interesses de “energias geoestratégicas” globais.

Assim é que o mantra da concepção da “dominação do espectro total”, “persuasivo na paz, decisivo na guerra, proeminente em qualquer forma de conflito”, constitui a espinha dorsal das chamadas revoluções coloridas, sintetizada pela dominação social, que se utilizam de técnicas psicológicas, ideológicas e de informação para conquistar “ativistas sociais”, naquilo que é chamado como “dominação caótica”.

As Revoluções Coloridas procuram se apoiar na ação desestabilizadora de ONGs multinacionais.

Andrew Korybko alerta que é interessante discutir o livro influenciador dos estrategistas das revoluções coloridas norte-americanas, intitulado Propaganda, publicado em 1928 por Edward Bernays, considerado pelo New York Times como “o pai das relações públicas”.

Bernays acreditava que poucas pessoas, em grande parte invisíveis, influenciam e orientam a forma de pensar das massas. “Se entendêssemos o mecanismo e os motivos da mente grupal, seria possível controlar e reger as massas de acordo com a nossa própria vontade, sem que elas percebessem”. De certa maneira isso lembra os conceitos utilizados pelos nazistas.

Mas essa orientação tem sido, hoje, largamente empregada nas mídias e redes sociais, de abrangência global, pelos arquitetos das revoluções coloridas e das guerras híbridas.

Estudos secretos recentes, continua Andrew, nos EUA, demonstram que foram realizados experimentos psicológicos em mais de meio milhão de usuários das redes sociais para “estudar como os estados emocionais são transmitidos pelas plataformas digitais”. O estudo foi chamado de “Experimental evidence of massive-escale emotional contagion through social networks”, Evidência Experimental do Contágio Emocional em Larga Escala Através das Redes Sociais.

A bem da verdade, afirma o autor, o Pentágono já investe milhões de dólares para financiar pesquisas semelhantes para o seu programa “Iniciativa de Pesquisa Minerva do Pentágono”, que busca aperfeiçoar o entendimento do que chamam “os Enxames Sociais e a mente de Colmeia” nas redes sociais. O fenômeno é considerado pelos fomentadores da Guerra Híbrida como o Manual de Campo das Revoluções Coloridas, cujo inspirador principal é Gene Sharp, o “Maquiavel da não Violência”.

O autor discorre ainda, em outro capítulo, sobre a concepção mais vasta da chamada Guerra Não Convencional, e a Revolução Colorida, que não acontece sozinha e é a continuação de um conflito já existente na sociedade, mas atua com o objetivo de direcionar o conflito para derrubar governos e favorecer os interesses estratégicos dos Estados Unidos.

Andrew Korybko afirma que as revoluções coloridas são fabricadas pela complexa interação de vários fatores, que podem ser subdivididos em diversas categorias de infraestruturas primárias: ideologia, financiamento, sociedade, treinamento, informação e mídia.

Os principais fomentadores das Guerras Híbridas são os Estados Unidos, particularmente hoje, quando as agressões militares precisam ser repensadas dez vezes, já que o atual mundo multipolar impede que a grande nação do Norte se utilize da sua famosa política do Grande Porrete, Big Stick, indiscriminadamente.

Mas os EUA não se encontram a sós nas utilizações da Guerra Híbrida, possuem o valioso auxílio do grande capital financeiro especulativo, o capital parasitário, dissociado dos investimentos produtivos, já que esse foi o maior beneficiário da total desregulamentação financeira advinda com a globalização mundial, permitindo a ele  adquirir uma capacidade descomunal de influência internacional.

Apesar de irreversível, a revolução tecnológica nos meios de comunicação não é neutra. Como qualquer grande acontecimento da humanidade, as mídias globais, as redes sociais, e outros excepcionais instrumentos de comunicação atuais encontram-se associados aos interesses predominantes dos Estados Unidos na geopolítica mundial.

Não é sem razão que o maior especulador global,  George Soros, vem atuando há décadas na desestabilização de várias nações. Recentemente ele lançou uma espécie de manifesto em defesa da Democracia contra o que chamou de emergência do surto popular nacionalista mundial, como se houvesse alguma nação ou Estado verdadeiramente soberano, que atuasse no teatro global, no tabuleiro de xadrez internacional, sem a primazia dos seus interesses nacionais econômicos, comerciais ou geopolíticos.

O fundo bilionário de George Soros procura cavar um abismo entre a defesa da democracia e a luta pelo interesse nacional.

O que George Soros pretende, com seus fundos bilionários e sua “filantropia” interesseira é impor, em meio aos seus ativistas identitários ou aos ingênuos, e aos pragmáticos, a falsa contraposição entre democracia e a centralidade da questão nacional, coisa que não existe, e nunca existiu em época ou lugar nenhum do mundo, salvo nas nações colonizadas, ou nas recolonizadas.

A fundação Open Society dirigida por George Soros tem marcado importante presença no Brasil, prestigiando e financiando movimentos e lideranças adeptas do identitarismo e do multiculturalismo.  

Ele é um dos principais mentores das chamadas agendas identitárias. Procura influenciar a opinião pública com uma pauta diversionista, visando sua fragmentação ad infinitum, de um contra todos e todos contra qualquer um.

Soros financia ativistas em redes sociais, onde o que jamais prevalece é o interesse nacional, o bem comum, a convivência social, razoavelmente harmônica, a busca de soluções aos graves problemas do País.

Mas, na verdade, a desestabilização persistente das instituições da República, o ataque ao Estado nacional, a tentativa de levar ao descrédito o sistema democrático, a desorientação generalizada em parcelas dos extratos médios, não são obra do acaso, possuem raízes nas Guerras Híbridas.

O livro de Andrew Korybko é uma instigante fonte de reflexão sobre os fenômenos políticos da atualidade e sua manipulação por meio da chamada Guerra Híbrida, de como as sociedades se encontram desinformadas sobre essa nova arma estratégica, usada diariamente contra as democracias e os Estados nacionais soberanos.

Trata-se de uma obra repleta de fontes de informação e pesquisa que podem ser consultadas e também nos ajuda a compreender os fenômenos sociais e políticos que têm sacudido o Brasil pelo menos, nos últimos sete anos.

O Brasil ainda não tinha passado por um contexto interno de tamanha desestabilização política, social, psicológica e midiática, que pode ser explicada como Guerra Híbrida, depois do fim da bipolarização mundial e do surgimento do mundo unipolar.

O Brasil é hoje uma das principais nações do mundo, de dimensões continentais, riquezas naturais estratégicas, inigualável biodiversidade, e por isso mesmo com um enorme potencial de crescimento econômico sustentável, que possibilita vencer as suas abissais desigualdades sociais e promover um salto civilizacional como poucos Países no planeta.

As manifestações que desafiam as autoridades chinesas em em Hong Kong integram o arsenal da guerra híbrida entre EUA e China.

A desorientação social e política no Brasil tem sido alarmante. No passado, colhemos e internalizamos a divisão política e ideológica produzida pela Guerra Fria e hoje nos deparamos com os devaneios identitários, que insistem em uma política de ódios difusos. Vivemos a entre uma hipotética esquerda multiculturalista e conservadores terraplanistas, intolerantes retrógados e medievalistas.

Mergulhado nessa confusão pantanosa, o País não se debruça com vigor e determinação sobre um projeto nacional de desenvolvimento soberano, democrático e progressista, em que se destaque a centralidade dos interesses nacionais, a união nacional, as nossas permanências Históricas, assim como as nossas imprescindíveis renovações.

Para que possamos compreender a atual realidade política global e nacional é fundamental que façamos uma leitura dos novos instrumentos dos conflitos geopolíticos em pleno curso no século XXI, sem o que vai nos faltar o instrumental imprescindível para que possamos atuar como atores conscientes e decididos na construção do presente e do futuro do povo brasileiro.

O livro de Andrew Korybko é uma valiosa contribuição e fonte consulta, que nos ajuda a compreender e trafegar, com êxito, por esse novo milênio.

Eduardo Bomfim
Eduardo Bomfim é advogado, foi deputado na Assembleia Constituinte que elaborou a Constituição de 1988.

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1 COMENTÁRIO

  1. O foco em Soros parece ser um terraplanismo à esquerda, tendo em vista
    a amplitude da aplicação da metodologia nos países islâmicos e Ásia Central da antiga cccr. O ápice com Hilary Clinton. A ligação com M. Albrith pela origem outorga uma ligação e influência, certo. A hiperconcentracao do capital financeiro nos legou um capitalismo de oligarcas. Vide Joesleys e Lemans. O time russo. A debandada de príncipes chineses com um trilhão de dólares de seu país no começo do ano 2018. Descisao do próprio bureau político. Todo mundo faz política. Os reinos árabes dos Emirados são um dos quatro centros financeiros da economia mundial.
    Estiveram nas primaveras Árabes até o talo.
    Os generais egípcios corrigiram o rumo. Erdogan está entrando na Líbia. Também Trump foi ruptura com as políticas primavera.

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