PIB cresce, mas demanda interna patina

    O PIB é a somatória do valor, a preços de mercado e descontada a inflação, de todas as mercadorias produzidas durante o ano. Parte dessas mercadorias são consumidas, parte são utilizadas para expandir a capacidade de produção, ou seja, tornam-se investimentos (aos quais se somam a construção de residências e a variação dos estoques), parte são consumidas pelo governo (gastos do governo) e parte são exportadas. Para que sobrem coisas para exportar não podemos consumir tudo internamente, ou seja, temos que poupar parte desses recursos reais para que possam ser vendidos ao exterior.

    Na maioria dos países, o consumo representa a maior parcela do PIB. No Brasil, o consumo responde por cerca de 68% do PIB. Há exceções. Na China, por exemplo, o consumo representa apenas 38% do PIB. Em compensação, enquanto na China o investimento corresponde a 44% do PIB, no Brasil representa apenas 17%.   Nada garante, portanto, que se o PIB cresce, a demanda interna vai subir na mesma proporção.

    No caso do Brasil, o crescimento do PIB no primeiro trimestre deste ano foi de 1,9%, mas 90% desse crescimento foi garantido pela agropecuária e agroindústria, cuja produção, em grande parte, é exportada. Em relação ao quarto trimestre do ano passado a produção agropecuária aumentou 21,6% neste primeiro trimestre de 2023. Na ordenação das taxas setoriais de crescimento do PIB no primeiro trimestre, a segunda taxa foi a da indústria extrativa, bem mais baixa, de 2,3%. E a média das 11 taxas setoriais, excluída a agropecuária, foi ainda menor, de apenas 0,4%. A indústria de transformação apresentou recuo de 0,6%, acumulando três trimestres consecutivos de desempenho negativo e a indústria da construção encolheu 0,8% em relação ao trimestre anterior. No primeiro trimestre o investimento apresentou uma queda de 3,4%, caindo para 17,1% do PIB e o consumo cresceu apenas 0,2%. Conforme matéria do jornal Valor (13/6). “O consumo das famílias opera mais fraco neste ano, ante 2022, e deve continuar com pouca reação até o fim de 2023”

    Considerando que o forte crescimento do PIB no primeiro trimestre se deveu a um setor fortemente marcado pela sazonalidade, é bastante provável que nos próximos trimestres tenhamos crescimento menor ou até negativo se levarmos em conta que as projeções de crescimento da economia para todo o ano variam entre 1,8% (Boletim Focus) e 2,4% (do próprio governo). Ou seja, não é impossível que tenhamos dois semestres seguidos de queda na taxa de crescimento, o que caracterizaria a chamada “recessão técnica” e com ela as inevitáveis críticas ao governo, tal como ocorreu, em 2022, com o governo Bolsonaro, quando a economia cresceu 1,0% no primeiro trimestre, seguida de 1,1%, 0,5% e -0,1% nos trimestres seguintes, fechando o ano com uma taxa de 2,9%.

    Apesar do bom desempenho do setor externo, há mais fatores negativos do que positivos influenciando o desempenho da economia brasileira em 2023, tais como a prevista queda no ritmo da economia mundial, o nível elevado de desemprego no Brasil, e a inadimplência em níveis recordes, tanto de pessoas físicas quanto de empresas. Um dado positivo foi o aumento do gasto das famílias nos supermercados. Segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), de janeiro a maio, o consumo das famílias aumentou 2,33% em relação ao mesmo período de 2022. Entre os fatores que provavelmente estão contribuindo para o maior consumo de comida estão o aumento do salário-mínimo que, em maio, passou em maio de R$ 1.302 para R$ 1.320, a queda no preço dos alimentos e o pagamento turbinado do Bolsa Família, que além dos R$ 600, iniciou em março deste ano o pagamento adicional de R$ 150 para cada criança com até seis anos de idade.

    Luís Antonio Paulino
    Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

    Não há posts para exibir

    Deixe um comentário

    Escreva seu comentário!
    Digite seu nome aqui