Brasil deve ampliar presença militar e cooperação internacional na Amazônia

Amazônia

O mal-estar diplomático em torno da Amazônia envolvendo o Brasil, a França, a Alemanha, a Noruega e outros países europeus não surpreende quem conhece um pouco da história do nosso País e das ambições coloniais europeias.

A Amazônia brasileira foi colhida no epicentro da sensível agenda mundial do aquecimento global e da questão climática. O problema é que legítimas preocupações ambientais estão entrelaçadas com ambições geopolíticas, interesses comerciais e graves deficiências do Estado brasileiro em administrar o desafio diplomático, ambiental, econômico e social da Amazônia.

Rigorosamente, a disputa pela Amazônia antecede o próprio conhecimento de sua existência. Quando em 1494 Portugal e Espanha celebraram o Tratado de Tordesilhas, dividindo o mundo conhecido e ainda a conhecer em áreas de influência das duas potências coloniais, deram início à corrida pelo domínio da grande bacia hidrográfica.

Portugal empenhou-se em jornada penosa e heroica para conquistar território que seria naturalmente espanhol. Sucessivas epopeias de notáveis varões lusitanos consolidaram o domínio Português.

Pedro Teixeira, em 1637, liderou a expedição de 70 soldados portugueses e 1200 índios flecheiros a bordo de uma verdadeira esquadra de canoas, que saindo de Gurupá, próximo a Belém, varou as águas do Amazonas e chegou a Quito, para espanto dos governantes espanhóis. Aí Pedro Teixeira estabeleceu os marcos da presença portuguesa ao longo da calha do grande rio.

Pouco depois, entre 1648 e 1651, provavelmente cumprindo missão em caráter secreto de Portugal, Antônio Raposo Tavares liderou a chamada Bandeira dos Limites, que saindo de São Paulo desbravou os sertões desconhecidos do Mato Grosso até o Peru, descendo pelo rio Amazonas até Manaus e Belém, de onde retornou a São Paulo. Em sua celebre biografia do grande bandeirante, o historiador português Jaime Cortesão qualifica a bandeira de Raposo Tavares como o maior feito na construção do Brasil.

Quem contempla antigo mapa pátrio e se depara com a presença das três guianas na nossa fronteira setentrional, defronta ali a memória da cobiça de três grandes impérios coloniais sobre a bacia amazônica.

As pretensões territoriais arrastaram-se até o Século XX. Em 1907, na questão do Pirara, o Brasil perdeu 20 mil quilômetros quadrados para a Inglaterra no que hoje é o estado de Roraima. Um pouco antes, em 1903, o Tratado de Petrópolis encerrava a questão do Acre com a aquisição desse antigo território boliviano, que passou perto de tornar-se um enclave norte-americano em pleno coração da Amazônia.

A questão é que o Brasil precisa ir além de confrontar interferências e ameaças como a do presidente francês Emmanuel Macron. O desafio é combinar ações de desenvolvimento econômico e social da Amazônia e de sua população, com iniciativas militares de dissuasão, ao lado de medidas de proteção do vasto patrimônio natural da região.

O Estado brasileiro e a sociedade não podem simplesmente condenar a economia existente na Amazônia como predatória sem oferecer alternativa de vida aos milhões de brasileiros que ali vivem, muitos dos quais ali chegaram incentivados pelo próprio Estado, quando o lema era “integrar para não entregar” ou “terra sem homens para homens sem-terra”. A questão é que governos nacionais e estrangeiros e ONGs resolveram tornar absoluta a proteção ambiental e criminalizar a população da Amazônia. Sem alternativa de sobrevivência para os habitantes locais as políticas ambientais têm gerado ilegalidades e conflitos.

Observando o conselho latino si vis pacem, parabélum, o Brasil deveria iniciar imediatamente a construção da base naval para a Segunda Esquadra no norte do Brasil. O lugar já foi escolhido pelo Comando da Marinha e visitado por mim e pelos comandantes da Marinha e do Exército na época em que fui ministro da Defesa.

O terreno junto ao porto de Itaqui, no Maranhão, seria transferido pelo Exército para a Marinha que ali localizaria a sua Segunda Esquadra, antiga aspiração da Força Naval.

O almirante Leal Ferreira e o general Eduardo Villas Boas concertaram durante a visita promover a transferência da titularidade da área. O então governador do Maranhão, Flávio Dino, acompanhou a visita e pôs o estado do Maranhão à disposição do Ministério da Defesa e do Comando da Marinha para apoiar o empreendimento.

Outra iniciativa seria transformar a Base Aérea de Boa Vista na principal Base Aeroespacial do País. Além de acompanhar a tendência mundial de conversão das forças aéreas em forças aeroespaciais, a mudança de status da Base de Roraima sinalizaria a reafirmação da centralidade da Amazônia na política de defesa do Brasil.

O Exército deveria ampliar a oferta de vagas para militares no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS) e estender a voluntários civis da Amazônia e de outras regiões do Brasil a possibilidade de frequentar os cursos de formação.

Para as populações indígenas da Amazônia, o Exército deveria ampliar a oferta de vagas para conscritos e engajados e criar em áreas de densidade populacional indígena acentuada Núcleos de Preparação de Oficiais da Reserva (NPORs) voltados para a guerra na selva e dirigido para formar oficiais de origem indígena.

Combinando a ampliação da presença econômica, social e militar na região, o Estado brasileiro teria condições de abrir a possibilidade de cooperação com o mundo no provimento de meios para a pesquisa da rica biodiversidade local em benefício do Brasil e da humanidade.

Poderíamos integrar centros de pesquisa e universidades do Brasil e do mundo com os centros de pesquisa e as universidades da Amazônia e dos países vizinhos, deixando claro que a indiscutível soberania do Brasil sobre o território não exclui a cooperação internacional em torno de objetivos comuns.

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Aldo Rebelo é jornalista, foi presidente da Câmara dos Deputados; ministro da Coordenação Política e Relações Institucionais; do Esporte; da Ciência e Tecnologia e Inovação e da Defesa nos governos Lula e Dilma.

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5 COMENTÁRIOS

  1. Aldo rebelo está certo e isso é o óbvio.
    Sempre estranhei essa mendicância brasileira para investir na Amazônia. O Brasil tem plenas condições de INVESTIR na Amazônia para dela tirar proveito sem ter de queimá-la.
    Também precisamos parar de afirmar que a vocação do Brasil é ser o celeiro do mundo. Quem entende um pouco de história sabe que isso é uma armadilha para nós. O Brasil não pode usufruir da Amazônia via Agricultura.
    Espanta até hoje não termos um “caminhão” de biólogos e geólogos na Amazônia.
    Outra mentira é essa tal de “Nação Yanomami”. O brasileiro precisa fazer uso da Amazônia e sobretudo conhecê-la.
    Chega de vassalagem meu povo, já está no nível insuportável.

    Mas o pior é saber que Bolsonaro tudo cederá aos EUA para acomodar seus filhos no poder. Ele está sim aparelhando o Estado com a conivência das FFAA.

  2. Sr. Ministro, como assessora especial do Ministro Celso Pansera, estive na Academia de Ciências da Finlândia propondo projetos de bioprospecção numa ação conjunta do Projeto Calha Norte e outros ministérios, sob a gestão do MCTIC . A Academia ficou super interessada e, no mesmo mês, enviou representante ao MCTIC para avançarmos no projeto de parceria. Era novembro de 2015. Em dezembro, Cunha deu início ao processo de impeachment. Desde então, o Brasil parou!

  3. Bastante interessante essas propostas do Aldo Rebelo, uma pessoa que possui um profundo conhecimento a cerca dos problemas Brasileiros. Aldo, tem grande contribuição a dar ao País.
    Aguardo mais e mais artigos Aldo.

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