A Ágora e o algoritmo – Direito e Democracia na era digital

Estudo poderoso entre as tensões entre o mundo virtual e o real
A Ágora e o Algoritmo - Direito e Democracia na era digital

Autores: Eduardo Appio e Salvio Kotter – Kotter Editores – 184 páginas

O Estado-juiz, a ágora e os algoritmos, segundo o juiz Appio

Em 2000, eu dizia:

“A crise do estado com a consequente perda da centralidade da política expressa-se no plano da subjetividade pela dissolução do cidadão em consumidor de produtos, de ideias, de serviços públicos e “privados”, de amor, de sexo … Desaparece a política, como meio de realização do ideal iluminista da liberdade como autonomia, em favor do mercado capitalista, a grande abstração normativa que regula com sua lógica instrumental o conjunto das relações sociais. A polis cede lugar ao shopping center. Assim, se o homem moderno buscou salvação na arte, na história, no desenvolvimento, na consciência social, o homem “pós-moderno” se entrega ao presente e ao prazer, ao consumo e ao individualismo. E imergimos no capitalismo niilista, tautológico, que já não necessita legitimar-se pelo interesse geral, bastando-se a si mesmo.” (“A subjetividade moderna: apontamentos sobre sua formação, desenvolvimento e crise na política e no Direito”, dissertação de mestrado para obtenção do grau de mestre em Filosofia do Direito, Universidade Federal de Santa Catarina – https://repositorio.ufsc.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/78346/182576.pdf?sequence=1&isAllowed=y).

O tema das (sempre complexas e tensas) interações entre política e direito acompanham minhas reflexões e vida civil desde a juventude, como aluno de direito e militante do movimento estudantil. Daí me alegrar que eu possa agora ler as reflexões atualíssimas do amigo juiz federal Eduardo Appio no seu novo livro, em co-autoria com Salvio Kotter., “A Ágora e o Algoritmo – Direito e Democracia na Era Digital – Um estudo poderoso sobre as tensões entre o mundo virtual e o real”, publicado pela Kotter Editorial.

Em diálogo pessoal comigo, o juiz Appio, velho amigo de doutorado na Universidade Federal de Santa Catarina (que ele concluiu e eu não, fagocitado que fui pela luta política em pleno governo Requião), diz que o objeto do livro é “o desafio de judicializar o conteúdo das redes sociais em equilíbrio com a liberdade de expressão e lisura das eleições gerais”. Para ele, “a democracia representativa está sendo asfixiada pelas Big Techs que pretendem decidir as eleições, conquistando corações e mentes por algoritmos especificamente direcionados aos eleitores”.

O co-autor, Salvio Kotter, diz que o livro, fundamentalmente baseado na tese doutoral de Appio, consegue demonstrar que fundamentos principiológicos são capazes de legitimar a jurisdição enquanto força promotora de direitos, e  “ [o] Judiciário como ator estrutural no arranjo democrático, não apenas intérprete de normas”, já que, “a intervenção judicial pode, de um lado, ultrapassar fronteiras e comprometer o equilíbrio entre poderes, mas, de outro, representar um contrapeso crucial à realização da justiça social.”

Pode ser. Mas, como escrevi em outro momento, não é agradável ver “[o]  neoconstitucionalismo “civilizatório” haver prometido o paraíso da garantia e da efetividade dos direitos fundamentais e ter entregado a “lava jato” e 11 supremos, nem todos sempre amigos do Brasil.”  (https://www.conjur.com.br/2024-nov-02/a-forca-expansiva-da-ideia-de-processo-estrutural-limites-e-possibilidades/)

E, ontem como hoje, sempre há quem queira capturar o processo penal para fazer política, para “fazer o bem” e salvar alguma coisa. Savanarolas os há à direita e à esquerda. Há quem pense e aja como se somente aquele lavajatismo que destruiu a engenharia pesada brasileira a serviço de interesses estrangeiros fosse nefasto, mas que há lavajatismos e lavajatismos, e que é possível um lavajatismo “do bem”. Mas não há lavajatismo do bem. A história não o reconhecerá.

Enfim, vamos ao livro do corajoso juiz Eduardo Appio, pois não há como fugir do debate, nem como fugir da ágora. Sócrates que o diga.

Samuel Gomes
Samuel Gomes dos Santos é advogado em Curitiba e Brasília, professor e Mestre em Filosofia do Direito.

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