Engenharia em baixa, Brasil na berlinda

Força-tarefa de Curitiba ignora o interesse nacional ao destruir empresas

O Brasil registra atualmente uma série de indicadores extremamente preocupantes. A face mais cruel e reveladora está certamente nos 13,1 milhões de desempregados no Brasil, conforme pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgada em 29 de março último. Se forem somados a esse grupo aqueles que labutam mas não têm atividade regular de 40 horas semanais e os que sequer conseguem procurar uma vaga apesar de precisarem dela, chega-se aos 27,9 milhões de chamados “subutilizados”.

Esses números mostram, a um só tempo, um terrível drama social e humano e a situação caótica da nossa economia, cujo crescimento em 2018 ficou em pífio 1,1%, repetindo o resultado de 2017 e longe de recuperar as retrações de 3,5%, em 2015, e 3,3%, em 2016. Mantendo a perspectiva pessimista, a expectativa para 2019 divulgada pelo Banco Central no início de abril ficou abaixo dos 2%.

Juntamente com o crescimento da pobreza gerado por esse cenário, há sérios gargalos na infraestrutura urbana e nos serviços essenciais comprometendo o bem-estar da sociedade, que sofre com a falta de moradia, saneamento, transporte, saúde e educação, para mencionar as questões básicas.

É mais que tempo de o Brasil tomar a decisão de reverter essa trajetória decadente, absolutamente incompatível com tudo que já foi capaz de realizar como nação, apesar de todas as mazelas a ainda serem superadas. Premissa inescapável para a correção de rumo que garanta crescimento econômico e condições de vida digna à população é a retomada da engenharia nacional. Não há hipótese de se alcançar prosperidade e avanço com o desmonte da capacidade tecnológica do País.

Um dia exportador de know-how e competidor global na realização de grandes obras, o Brasil hoje vê suas construtoras postas praticamente fora do jogo devido às consequências da operação Lava Jato. Essa, equivocada e inexplicavelmente, inviabilizou empresas em vez de simplesmente punir os indivíduos praticantes de delitos.

As consequências dessa lógica foram medidas pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (Ineep), que aponta “desmonte de importantes setores da economia nacional, principalmente da indústria petrolífera e da sua cadeia de fornecedores, como a construção civil, a metal-mecânica, a indústria naval, a engenharia pesada, além do programa nuclear brasileiro”. Segundo artigo do professor William Nozak, estudioso do setor, “apenas em seu primeiro ano, estima-se que a Lava Jato retirou cerca de R$ 142,6 bilhões da economia brasileira”. Significa que a operação produziu prejuízos bem mais elevados que aqueles causados pela corrupção, calculados em cerca de R$ 50 bilhões, num pacote que inclui pagamentos de propinas e desvios com formação de cartel, superfaturamento em obras e fraudes em licitações.

Problemática também foi a redução da obrigatoriedade de contratação de conteúdo local na exploração de gás e petróleo em reservas brasileiras. Isso vai na contramão do interesse da indústria e da engenharia nacionais e as coloca fora da cadeia produtiva do setor. O Brasil torna-se mero exportador de óleo bruto; a riqueza significativa é gerada em outros países.

Na mesma linha, se deu o fim de obrigatoriedade de participação da Petrobras na exploração das reservas do pré-sal. Principal empresa brasileira e essencial para que Brasil se firme entre os grandes produtores de petróleo, a companhia passa por um processo de desinvestimento e venda de ativos que tende a encolhê-la e a reduzir sua relevância.

Completa o quadro de desestruturação da nossa inteligência produtiva a franca desnacionalização do setor de projetos com a entrada indiscriminada de escritórios estrangeiros no mercado brasileiro e a aquisição das principais firmas nacionais por companhias de outros países.

Esse pacote vem se refletindo diretamente na engenharia e nos seus profissionais. Apenas entre janeiro de 2014 e dezembro de 2017, haviam sido eliminados mais de 50 mil empregos da categoria no País, conforme levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a partir de informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Esses números não revelam ainda as dificuldades de outros milhares de profissionais da área tecnológica que são autônomos, microempresários ou proprietários de pequenas e médias empresas que vêm sofrendo com a falta de trabalho.

Garantir oportunidade e valorização dessa mão de obra qualificada e absolutamente essencial ao desenvolvimento é parte imprescindível de um programa nacional de crescimento sustentável que precisa urgentemente ser desenhado e posto em prática. A alternativa a isso é relegar o Brasil a condição subalterna no contexto da globalização e condenar o seu povo a pobreza e precariedade.

Murilo Pinheiro é presidente da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP)

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2 COMENTÁRIOS

  1. Não tenho como fazer paralelos entre experiências das nações que mobilizam forças democráticas para construção de modelos econômicos que não se coadunam às regras impositivas da monopololização do capital financeiro global. Invariavelemente, tais experiências enfrentam resistências demolidoras.
    Esse fenômeno destruidor tem sua mira centrada na economia. Qualquer arranjo econômico que contraria a lógica do monopólio de Wall Sreet deve ser destruído.
    Foi assim com a vibrante economia dos países do extinto bloco socialista da URSS; com a economia do país emergente sob o Estado Democrático de Direito no Brasil nos últimos 20 anos; e tem sido assim com as investidas de Trump contra o “socialismo de mercado” edificado na China.

  2. Excelente e muito necessária a denúncia do esfarelamento dos nossos potenciais em relação a infraestrutura. Parabéns ao portal Bonifácio, que desde já entra para o rol dos preferidos.

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