O Plano Político das frentes amplas

Na ascensão dificultosa do Partido Nacional Socialista na Alemanha de Weimar faltou a união essencial dos Socialistas, Católicos e Comunistas para barrar Adolf Hitler de sua chegada ao Poder por uma escassa maioria no Reichstag. Hitler não teve votação esmagadora e uma união de suas oposições lhe teria barrado o caminho. Faltou esse senso de salvação do País antes de se pensar somente nas plataformas individuais de cada partido. A desunião SEMPRE beneficia os totalitários através da História.

A eleição alemã de 1932, última em que Hitler ainda não estava no poder, deu aos nazistas 33% dos votos, menor percentagem do que Bolsonaro teve em 2018, MAS foi após a indicação de Hitler como Chanceler, em janeiro de 1933, que o controle dos votos pelo autoritarismo levou à ditadura final.

Antes da fatídica sessão que nomeou Hitler Chanceler, a soma dos partidos antinazistas teria salvo a Alemanha, mas eles estavam desunidos e abriram espaço para os nazistas.

A legítima luta por plataformas de projetos políticos em TEMPOS NORMAIS cabe aos partidos, por definição um instrumento de batalha contra o inimigo maior, que ameaça o conjunto do País. É a ameaça acima de divergências temáticas, é o Titanic que afunda, levando ao naufrágio todas as classes.

No propósito de montar uma frente ampla contra a ameaça autoritária da ultradireita, potênciais participantes colocam como condição da frente o embandeiramento de projetos, algo que não faz parte dos alvos de uma frente que se desfaz quando o inimigo comum é derrotado, o mecanismo histórico tem longa trajetória no campo político e militar.

Do Front Populaire à desunião do Parlamento de Bordeaux

A vexatória derrota militar e política da França em 1940 foi produto da FALTA de uma Front Populaire, desfeita aquela de 1936 de Leon Blum, agora a desunião foi a senha para a rendição do Parlamento de Bordeaux frente ao Terceiro Reich, desunião entre todos, dos católicos aos comunistas e socialistas, abrindo espaço para a traição.

Na Segunda Guerra o conceito de FRENTE uniu adversários históricos: a União Soviética, o Império Britânico e os Estados Unidos, cujos líderes tinham objetivos conflitantes e antagônicos, mas se sentiam todos ameaçados pelo nazismo como perigo mais próximo e maior.

Derrotado o inimigo comum, a frente imediatamente se desfez, dando início à Guerra Fria, dias depois da Conferência de Potsdam, que foi o fecho do conflito e acerto dos despojos de guerra.

O conceito de ALIADOS foi a frente clássica, união contra um inimigo comum que oferece maior e mais imediato risco a todos. Às grandes potências se uniu uma força sem território, a França Livre do General De Gaulle, que saiu do conflito como líder de uma ideia de França anti-colaboracionista, mas que imediatamente ganhou território acompanhando os exércitos anglo-americanos após o desembarque na Normandia.

Foi De Gaulle e não os anglo-americanos quem aceitou a rendição do General von Choltitz na Gare du Nord em Paris, operação de grande significado simbólico. Patton já estava às portas de Paris e se viu obrigado a parar para que De Gaulle fosse o libertador, operação duramente bancada por Eisenhower, que precisou ameaçar Patton de demissão para que ele estacionasse suas tropas, permitindo a passagem à frente da divisão gaullista Leclerc, libertadora de Paris. O simbolismo da frente atingiu o máximo: se De Gaulle não libertasse Paris os comunistas o fariam antes de Patton e ganhariam o poder no pós-guerra.

Uma frente contra o mal maior

Frentes amplas se formam com a reunião de um arco de forças heterogêneas para evitar um naufrágio do país frente a um claro perigo maior que os projetos de cada partido.

O atual governo errático, caótico, sem capacidade de administrar por falta de experiência, inteligência e conexões, orientado por um charlatão, criando atritos com outros países e organismos multilaterais, sem projeto, sem credibilidade, sem mecanismos de ação e reação, pode DESCONSTRUIR a administração pública e em consequência a economia.

Não é uma crise resultante de um mau governo, é algo muito maior, uma economia em frangalhos, abalada nas suas raízes, relações internacionais esgarçadas ao máximo, especialmente se, como se prevê, Trump perder as eleições nos EUA, o governo do Partido Democrata não dará respiro a um governo inconsequente no Brasil.

Os que não querem uma frente ampla

Uma frente ampla no Brasil tem inimigos naturais, o grande capital financeiro, as FIESPs, a CNI e a FIRJAN, o baixo clero com projetinhos pessoais fisiológicos, a elite americanizada, os falsos apóstolos, os boçais do rádio, os grileiros e os madeireiros ilegais da Amazônia. Há sim uma frente de apoio ao desgoverno contando com o suporte fundamental do PT.

Lembrando que o governo de Vichy manteve amplo apoio mesmo depois do desembarque dos Aliados na Normandia, regimes totalitários, qualquer um, têm arco de apoiadores, porque há núcleos em todas as sociedades que gostam do autoritarismo, da  truculência, da bazófia, da boçalidade e da violência contra indefesos. O nazismo

teve fanáticos durante e após a derrota, núcleos fugitivos sobreviveram à rendição de 1945 na Argentina, no Paraguai, na Bolívia e rebrotam hoje na Alemanha e na Polônia.

A esquerda desunida

A não adesão do PT a uma frente ampla é a maior defesa do atual Governo e pode levá-lo à reeleição. A lógica do PT é anti frente ampla porque se coloca como contraponto isolado contra a ultradireita e vê nesse isolamento uma oportunidade de vencer sozinho, o que a análise das forças mostra ser quase impossível.  A não renovação de lideranças do PT pode levá-lo ao isolamento e decadência, partidos históricos sem renovação vão para o arquivo morto porque a política é dinâmica e mutante.

Ao se manter como contraponto à ultradireita, o PT justifica estar no comando como salvação contra o petismo, a ultradireita liderando uma FRENTE AMPLA DO CONSERVADORISMO contra o PT, quer dizer, o instrumento da frente ampla será usado pela ultradireita para se manter no poder, usando o PT como o inimigo a manter longe.

Ao não aderir a uma frente ampla contra o desgoverno, o PT destrói seu papel histórico em benefício de uma hipótese remota de voltar SOZINHO ao poder, um sonho.

O Brasil está em um momento de inflexão, como a Inglaterra em 1939, quando o Partido Conservador mantinha férreo controle do Governo, mas os acontecimentos obrigaram o gabinete Chamberlain a aceitar um controvertido e indesejado político, Churchill, como Primeiro Ministro, deslocando Chamberlain para um Ministério sem pasta como consolação. Os acontecimentos moldaram a política partidária, os ultraconservadores como Lord Halifax detestavam Churchill, mas não tiveram saída, era ele ou o caos.

O PT está em um momento de inflexão, sem candidatos viáveis para as grandes prefeituras do Sudeste, ou adere a uma frente ampla, ou irá fenecendo para a irrelevância.

Apenas para registro, o PTB já foi o partido central da política brasileira, chegou à Presidência e hoje, sem renovação, é um fantasma histórico e ainda de má reputação.

Em 2018 o PT conseguiu o apoio de todas as forças progressistas que viram o perigo da ultradireita populista, mas esse apoio foi eventual e acidental, hoje seria muito mais difícil.

Há no Brasil um amplo arco de forças civilizadas de muitos partidos políticos com programas diferentes, mas que precisam da democracia e das instituições funcionando para sobreviverem, todos estão ameaçados pela ultradireita agressiva e é hora de todos se unirem contra o grande risco antidemocrático, o PT não pode ser exceção.

Um panorama internacional em ampla mutação, no qual se prevê a volta dos Democratas ao poder nos EUA, redefinirá o jogo de forças na geopolítica mundial, isolando os extremistas da ultradireita, hoje presentes só no Brasil, Hungria e Polônia, regimes que irão para o ostracismo histórico em tempos de pós-pandemia, quando o que menos o mundo precisa é de autoritarismos isolacionistas e sem políticas públicas de inclusão que exigem governos solidários e civilizados que a direita  não tem no seu receituário.

Andre Araujo
Andre Araujo, advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo, conselheiro da CEMIG-Cia. Energética de Minas Gerais e atualmente é consultor de Potomac Partners, consultoria em Washington.

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