Comandante-em-chefe das Forças Armadas da Ucrânia reconhece que a guerra chegou a um impasse

O comandante-em-chefe das Forças Armadas da Ucrânia, general Valery Zaluzhny, afirmou em entrevista à revista inglesa The Economist que a guerra chegou a um impasse e que tal situação tende a favorecer a Rússia por possuir mais recursos humanos e disponibilidade de armas e munições para sustentar uma guerra prolongada. Em ensaio publicado na mesma revista, o general afirma que apenas um grande salto tecnológico poderia permitir o rompimento do impasse. Na atual situação, com os dois lados utilizando as mesmas tecnologias que permitem a cada lado ver tudo o que o outro está fazendo e interferir nos seus respectivos sistemas de comunicação, essenciais para uma guerra na qual a arma mais estratégica tem sido os drones, é praticamente impossível transpor as linhas russas de defesa no leste do país.

No mencionado artigo o general enumera as cinco prioridades para que o impasse seja rompido: superioridade aérea, capacidades muito melhoradas de guerra eletrônica e contrabateria, nova tecnologia de remoção de minas e a capacidade de mobilizar e treinar mais combatentes. Nenhuma delas, entretanto, está facilmente ao alcance dos ucranianos e, na medida em que a guerra se prolonga, podem diminuir, seja porque a disposição do Ocidente, nomeadamente dos Estados Unidos, de apoiar a Ucrânia com armas e dinheiro tende a decair, seja porque a capacidade da Ucrânia de mobilizar mão de obra para a guerra vai se esgotando, uma vez que o país tem uma população que é apenas um terço da população russa.

O general Zaluzhny afirmou na entrevista e no ensaio publicado na Economist que a tecnologia moderna e as armas de precisão de ambos os lados estavam impedindo as tropas ucranianas de romper as linhas inimigas, incluindo o uso generalizado e a capacidade de bloquear drones. Destacou que o impasse foi em grande parte resultado da paridade tecnológica no campo de batalha, com ambos os lados usando sensores modernos para detectar tropas e equipamentos. Para ele, seriam necessários avanços na guerra eletrônica para romper o impasse.

O coronel Roman Kostenko, presidente do comitê de defesa e inteligência do Parlamento da Ucrânia, ao comentar as afirmações do general ucraniano, afirmou que “O ensaio também deveria sinalizar ao Ministério da Defesa, responsável pela aquisição de armamento, que o seu foco na obtenção de armas pesadas, incluindo tanques e artilharia, é menos significativo do que a procura de novas tecnologias e armamento de precisão. Segundo ele, os militares ucranianos já destroem mais peças de artilharia e veículos blindados russos com drones do que com artilharia”.

O general Zaluzhny, também reconheceu que os russos, utilizando os mesmos recursos, já inutilizaram uma parte significativa dos equipamentos mais modernos fornecidos pelos Estados Unidos, seja destruindo-os com ataques de drones, seja interferindo nos sistemas de comunicação. Segundo o general, “ O simples fato é que vemos tudo o que o inimigo está fazendo e eles veem tudo o que estamos fazendo”. Pare ele, segundo a revista, “a eficácia das armas fornecidas pelo Ocidente diminuiu porque utilizam tecnologia de navegação GPS que é vulnerável aos sistemas de interferência de comunicações russos. A guerra eletrônica é a mão invisível por detrás de grande parte da guerra, com as capacidades russas que superam as dos ucranianos. As forças russas podem detectar sinais de celulares e bloquear GPS e frequências de rádio. A Ucrânia possui os seus próprios sistemas de guerra eletrônica, mas os seus soldados queixam-se frequentemente de que a Rússia tem consistentemente a vantagem nesta área”.

A grande incógnita para o futuro da guerra são as eleições nos Estados Unidos no próximo ano, uma vez que a disposição dos republicanos de apoiar indefinidamente a Ucrânia não é a mesma dos democratas. Segundo o Wall Street Journal (21/11), “O apoio dos EUA a Kiev ficou paralisado no Congresso. Os republicanos na Câmara concordaram em financiar apenas a parte israelita de um pacote proposto de 106 mil milhões de dólares para a Ucrânia, Israel e Taiwan. O Pentágono tem cerca de 5 bilhões de dólares em financiamento no seu orçamento para continuar a fornecer armas à Ucrânia. Mas outro pacote de dinheiro reservado para reabastecer os próprios estoques militares dos EUA enquanto abastecem a Ucrânia caiu para apenas US$ 1,1 bilhão, o que significa que os cofres do Pentágono estão quase vazios, disseram autoridades”.

O fato é que quanto mais a guerra se prolonga, mais favorece os russos, seja porque têm maior capacidade de mobilização de mão de obra para, seja porque sua poderosa indústria bélica terá mais tempo para recompor seu estoque de armamentos e desenvolver novos equipamentos que neutralizem mais eficazmente as armas fornecidas pelo Ocidente. Quanto mais passa o tempo, mais dificuldade os aliados do Ocidente terão para apoiar a Ucrânia com armas e dinheiro, dado o desgaste político que o gasto ilimitado de dinheiro para a guerra provoca entre os eleitores numa época que o corte de gastos públicos e a necessidade de ajuste fiscal virou um mantra repetido todos os dias pelos governos neoliberais da Europa e dos Estados Unidos para seus eleitores. É inevitável que as pessoas se perguntem por que não há dinheiro para resolver os graves problemas de seus países e não falta para alimentar a guerra.  Diante desse quadro, é bastante provável que os russos não queiram se sentar à mesa de negociações antes das eleições nos Estados Unidos a não ser que os ucranianos aceitem a perda definitiva dos territórios atualmente ocupados pela Rússia.

Luís Antonio Paulino
Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

Não há posts para exibir

Deixe um comentário

Escreva seu comentário!
Digite seu nome aqui