A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor tarifas ao Brasil parece ter sido impulsionada por uma combinação de fatores políticos e econômicos, com a política interna americana e a tentativa de influência sobre a situação brasileira em destaque.
O principal catalisador do tarifaço foi o apoio de Trump a Jair Bolsonaro. Em meio ao julgamento de Bolsonaro por suposta conspiração golpista, Trump interveio publicamente e, de forma surpreendente, impôs tarifas de 50% ao Brasil. Essa ação foi interpretada como uma forma de pressionar o Brasil e apoiar politicamente a ala de extrema-direita que se alinha com o ex-presidente. A pressão da diplomacia de Trump para reverter o que ele considera “bullying judicial” contra Bolsonaro não surtiu efeito, e o governo americano optou por uma medida mais ampla, que afetaria a economia brasileira.
Paralelamente, os Estados Unidos têm demonstrado um crescente interesse nos “minerais críticos” do Brasil, como o nióbio, que são cruciais para a transição energética e a indústria de alta tecnologia. O tarifaço pode ser visto como uma tática de negociação para que o Brasil conceda aos EUA uma posição privilegiada no acesso a esses recursos. O governo de Lula, por sua vez, demonstrou cautela e uma postura defensiva, afirmando que o país não abriria mão de sua soberania sobre esses recursos.
Embora o Brasil seja um parceiro comercial importante para os EUA, as tarifas também refletem a visão de Trump sobre o protecionismo brasileiro. Mesmo com um superávit comercial para o Brasil, Trump vê o país como excessivamente fechado, e as tarifas seriam uma forma de forçar o governo brasileiro a abrir mais o seu mercado para os produtos americanos.
Os efeitos das tarifas não seriam uniformes e atingiriam de forma desproporcional diferentes setores e empresas. A agência de classificação de risco Moody’s alertou que 15 grandes empresas brasileiras estavam em risco devido às tarifas. A Embraer, com sua forte dependência do mercado americano para aeronaves e serviços, foi classificada como a empresa com maior exposição. Outras empresas, como a Suzano e a Votorantim, também foram citadas, embora com um risco considerado moderado, devido à diversificação de seus negócios. Essa lista mostra que mesmo as maiores empresas do país não estão imunes a esse tipo de ação comercial.
As pequenas e médias empresas são as mais vulneráveis. Elas tendem a depender de um número limitado de mercados e têm pouca capacidade de absorver o aumento de custos ou de se realocarem rapidamente para outros países. Sem um grande poder de lobby ou associações fortes para defendê-las, muitas dessas empresas enfrentaram um cenário de “desespero”, com a iminência de perderem seus principais clientes nos EUA.
O tarifaço não atinge apenas grandes conglomerados, mas também o “coração” da economia brasileira, que são as pequenas e médias empresas. A perda de competitividade e a dificuldade de repassar o custo das tarifas aos clientes americanos ameaçam a viabilidade de muitos desses negócios, colocando em risco empregos e a sustentabilidade de cadeias produtivas inteiras.
Diante da ameaça das tarifas, o governo brasileiro adotou uma estratégia de diálogo e negociação. A diplomacia brasileira, liderada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, iniciou conversas com o secretário de Comércio dos EUA. O objetivo era evitar a aplicação total das tarifas e encontrar uma solução negociada. Alckmin ressaltou que as discussões estavam sendo conduzidas de forma pragmática, “sem contaminação política nem ideológica”.
As negociações não buscavam uma revogação completa, mas sim uma solução provisória, como a suspensão das tarifas até que um acordo mais amplo fosse alcançado. A diplomacia brasileira conseguiu um “freio na escalada” do conflito, indicando que as conversas estavam progredindo para evitar uma crise comercial completa.
Em uma medida sem precedentes contra uma autoridade de um país democrático, o governo Trump aplicou a Lei Magnitsky ao ministro do STF, Alexandre de Moraes. A lei, que sanciona estrangeiros por corrupção ou violações graves de direitos humanos, foi usada para bloquear contas bancárias e proibir a entrada de Moraes nos EUA. A justificativa do governo americano foi que Moraes usou sua posição para “autorizar detenções arbitrárias” e “suprimir a liberdade de expressão”. O secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, citou nominalmente Bolsonaro como um dos alvos do ministro em uma “caça às bruxas”. Essa ação, além de pressionar a diplomacia brasileira, visava interferir no julgamento de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.
Quando efetivamente anunciado, o tarifáço se mostrou muito menos abrangente do que o governo Trump anunciava inicialmente. Contribui para isso a pressão dos importadores norte-americanos que dispõem de fontes alternativas a diversos produtos importados do Brasil. Ainda assim, produtos importantes da pauta exportadora do Brasil para os Estados Unidos, como o café, a carne bovina e as frutas, foram atingidos pelas tarifas de 50%, o que os torna menos competitivos no mercado norte-americano.
Uma lista de exceções com quase 700 itens foi criada, poupando produtos estratégicos como suco de laranja, aviões e celulose. As exportações brasileiras para os EUA no primeiro semestre totalizaram US$ 20 bilhões, dos quais 41% (US$ 8,2 bilhões) foram de produtos na lista de exceções.
Embora as exceções atenuem os efeitos, o impacto sobre setores estratégicos da economia é considerado expressivo. As pequenas e médias empresas, que têm menos poder de barganha, são as mais vulneráveis a esse tipo de medida.
O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou ao secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, que a ingerência na soberania nacional em decisões do Poder Judiciário é “inaceitável e descabida”. O Planalto, em nota, também classificou a interferência americana como “inaceitável”.