“Sul Global” sem a China é uma pseudo-hipótese

    *Jiang Shixue

    Algumas pessoas descobriram que a maioria dos países desenvolvidos do mundo está no hemisfério norte, e a maioria dos países em desenvolvimento está no hemisfério sul. Portanto, “Norte” é sinônimo de “países desenvolvidos”, e “Sul” é idêntico a “países em desenvolvimento”. E o modelo Norte-Sul são as relações entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento, enquanto o padrão Sul-Sul é a cooperação entre países em desenvolvimento. Esse entendimento tornou-se um consenso internacional. Mesmo Deng Xiaoping disse, em meados da década de 1980, que a ordem internacional era caracterizada por quatro palavras: “Leste” e “Oeste, e “Norte” e “Sul”, significando que a relação Leste-Oeste se refere à relação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, e a relação Norte-Sul significa a relação entre países socialistas e países capitalistas.

    Além da palavra “Sul”, há também o termo “Sul Global” que tem aparecido de tempos em tempos no meio acadêmico e na mídia ao redor do mundo. Diz-se que foi cunhado por um ativista político americano, Carl Oglesby (1935-2011). Em 1969, ele publicou um artigo sobre a Guerra do Vietnã em uma revista católica chamada Commonwealth, em que disse que a Guerra do Vietnã foi o resultado inevitável de centenas de anos de “domínio do Sul Global” pelo Norte Global.

    O que é surpreendente é o fato de que, depois de entrar em 2023, o “Sul Global” atraiu atenção sem precedentes de muitas pessoas, tanto internacionalmente quanto na China. A popularidade dessa frase pode estar relacionada às três conferências a seguir: A primeira foi a “Cúpula da Voz do Sul Global”, na Índia, em 6 de janeiro de 2023. O anfitrião convidou 120 países, excluindo a China. A segunda foi a Conferência de Segurança de Munique, entre 17 e 19 de fevereiro de 2023, em que um dos painéis foi intitulado “Recalibrando a Bússola: Cooperação Sul-Norte”. A terceira foi a cúpula do G7 em Hiroshima, no Japão, em maio de 2023. Esta cimeira definiu duas agendas, uma das quais foi “Alcance ao Sul Global”. Alguns países em desenvolvimento participaram nesta cimeira, mas a China também não foi convidada.

    Apesar do alarde da expressão “Sul Global”, é preciso ressaltar que não há consenso sobre sua definição. Enquanto alguns acreditam que é o mesmo com “Sul”, ou seja, países em desenvolvimento, países subdesenvolvidos, países pobres ou países atrasados, outros argumentam que, como a ultrapassada expressão “Terceiro Mundo”, ela mantém uma forte conotação política, refletindo a natureza da ordem mundial dividida pelos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Outros ainda tendem a dizer que, enquanto o termo “países em desenvolvimento” reflete sua individualidade, o “Sul Global” presta mais atenção a eles como um corpo coletivo e também destaca os múltiplos impactos da globalização sobre os países em desenvolvimento.

    Infelizmente, é justamente pela falta de uma definição bem reconhecida, as pessoas muitas vezes utilizam o termo “Sul Global” seguindo seus próprios caprichos ou interpretam seu próprio entendimento como sua definição do termo. Não importa se a falta de uma definição bem reconhecida levará à confusão acadêmica e ao desentendimento, mas é necessário ressaltar que alguns países, os Estados Unidos em particular, desejam expulsar a China da família do “Sul Global”. Aliás, já quando Trump estava no poder, os Estados Unidos já tinham dito que a China não é um país em desenvolvimento. Por exemplo, no “Memorando Presidencial sobre a Reforma do Status dos Países em Desenvolvimento na Organização Mundial do Comércio”, emitido em 26 de julho de 2019, os Estados Unidos anunciaram que nunca aceitaram a reivindicação da China de status de país em desenvolvimento.

    Escusado será dizer que as motivações dos Estados Unidos não terão sucesso porque o estatuto internacional de um determinado país não é decidido por alguns países, mas pela comunidade internacional como um todo. Em seu relatório intitulado “Forjando um Sul Global”, em 19 de dezembro de 2004, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) já havia incluído a China na lista do “Sul Global”, que consiste em mais de 130 países em desenvolvimento.

    É verdade que, à medida que a sua economia está a crescer rapidamente, o estatuto internacional da China tem aumentado de dia para dia. Mas a identidade da China como país em desenvolvimento não mudou. Num futuro próximo, a China continuará a ser membro da grande família de países em desenvolvimento e continuará a dar contribuições para a prosperidade comum dos países em desenvolvimento, promovendo a cooperação Sul-Sul. Portanto, “Sul Global” sem a China é uma pseudo-hipótese ou uma falsa proposição.

    Professor Distinto – Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau.

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