Investimentos chineses no Brasil

    O Conselho Empresarial Brasil China divulgou o relatório sobre investimentos chineses no Brasil em 2023. A seguir destacamos os principais pontos do sumário executivo do relatório, cuja íntegra está disponível no site da CEBC (https://www.cebc.org.br/ ):

    1)   Os investimentos chineses no Brasil somaram US$ 1,73 bilhão em 2023, um aumento de 33% em relação ao ano anterior. Ainda que o total aportado tenha crescido, o valor é o segundo mais baixo desde 2009, superando apenas o resultado de 2022, quando os investimentos chegaram a US$ 1,3 bilhão.

    2)   Em 2023, o número de projetos chineses confirmados no país chegou a 29 – soma 9% inferior ao total de 2022. Apesar da queda, esse é o terceiro maior número registrado na série histórica iniciada em 2007.

    3)   A efetivação do valor dos investimentos chineses no Brasil – ou seja, o percentual de projetos anunciados que de fato foram colocados em prática – subiu de 27% para 88% entre 2022 e 2023.

    4)   Desde 2017, o número de projetos de investimentos chineses no Brasil tem mantido níveis relativamente altos, variando entre 24 e 32 por ano – exceto em 2020, quando foram registrados apenas oito empreendimentos por conta do ápice da pandemia de Covid-19.

    5)   O aumento dos investimentos chineses no Brasil em 2023 ocorreu apesar da queda de 17% nos investimentos estrangeiros de forma geral no país.

    6)   A área de eletricidade liderou a atração de investimentos chineses no Brasil em 2023, com participação de 39% em termos de valor e de 66% pelo critério de número de projetos.

    7)   Em segundo lugar, o setor automotivo respondeu por 33% do valor aportado – um ganho de participação de 5 pontos percentuais em relação ao ano anterior. Desde 2021, todos os projetos chineses no setor automotivo no Brasil foram direcionados a veículos 100% elétricos ou híbridos.

    8)   Em 2023, de todos os projetos chineses no Brasil, 72% foram direcionados a energias verdes e setores relacionados – 16 pontos percentuais a mais do que em 2022 e a maior participação registrada desde o início da série histórica em 2007.

    9)   Os projetos chineses no Brasil em 2023 foram direcionados sobretudo à região Sudeste, que absorveu 68% dos empreendimentos, seguida pelo Nordeste (16%), pelo Centro–Oeste (13%) e pelo Sul (3%).

    10) São Paulo atraiu 39% dos projetos chineses em 2023, seguido por Minas Gerais, com 29%, e por Goiás, com 10%. Bahia e Ceará absorveram 6% dos empreendimentos individualmente, enquanto Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Paraíba tiveram, cada um, fatia de 3%.

    11) A maior parte dos investimentos chineses ingressou no Brasil em 2023 por meio de iniciativas greenfield, com o estabelecimento de novos negócios ou novas rodadas de investimentos em projetos iniciados anteriormente. Essa modalidade representou 83% do número de empreendimentos e 90% do valor aportado.

    12) O Brasil foi o nono país que mais recebeu capital produtivo chinês em 2023, mantendo a mesma posição do ano anterior. Em anos recentes, países em desenvolvimento têm atraído a maior parte do valor investido pela China no mundo, chegando a representar 9 dos 10 principais destinos dos aportes do país asiático em 2023.

    13) Na América Latina e no Brasil, os investimentos chineses têm sido menos volumosos nos últimos anos, mas vêm avançando nas chamadas “novas infraestruturas”, que incluem iniciativas em áreas que estão no centro dos planos de desenvolvimento de Pequim, como energias renováveis, mobilidade elétrica, Tecnologia da Informação, infraestrutura urbana e manufaturas de alto padrão.

    14) A agenda do power shoring, estratégia corporativa voltada à descarbonização para a produção de bens intensivos em energia para exportação, apresenta uma janela de  oportunidade para a atração de novos investimentos chineses no Brasil na indústria e em áreas ligadas ao processo de transição energética, considerando as diversas vantagens comparativas do país, como sua matriz energética limpa, a vasta disponibilidade de água doce, suas reservas de minerais críticos e a distância dos grandes temas geopolíticos contemporâneos.

    15) Em linha com o aumento dos investimentos chineses no Brasil, números oficiais da China mostram que os aportes não-financeiros do país asiático no mundo aumentaram 11,4% em 2023. Alternativamente, UNCTAD e OCDE apontam quedas de, respectivamente, 9,4% e 12% nos investimentos chineses no exterior.

    16) Entre 2022 e 2023, os investimentos chineses caíram 36% nos Estados Unidos, 57% na Austrália e 4,2% na União Europeia e Reino Unido, mas aumentaram 37% nos países da Belt and Road Initiative

    17) Em termos de estoque, os investimentos chineses no Brasil entre 2007 e 2023 somaram US$ 73,3 bilhões, resultado de 264 projetos confirmados. O segmento de eletricidade absorveu 45% do valor total, seguido pela área de extração de petróleo, com 30%. Se considerado o número de projetos – e não seu valor financeiro –, o segmento de eletricidade também lidera, com 39% dos empreendimentos, mas a indústria manufatureira vem logo na sequência, com participação de 23%.

    18) O Sudeste atraiu 54% do número de projetos chineses no Brasil entre 2007 e 2023, seguido pelas regiões Nordeste (16%), Centro-Oeste (13%), Sul (9%) e Norte (7%). Na análise por unidade federativa, São Paulo segue na liderança, com participação de 36,2%.

    Outro levantamento realizado pelo site Poder 360 informa que projetos de infraestrutura de empresas chinesas superam R$ 280 bi no Brasil. De acordo com o site, a maior parte desses investimentos são na área de energia e a empresa que mais investe nesse setor é a estatal chinesa State Grid, com aporte de cerca de R$ 200 bilhões em usinas de geração renovável e linhas de transmissão de energia, distribuição de energia em SP, MG, RS e PR e linha de transmissão de ultra alta tensão Maranhão-Goiás.

    Outra estatal chinesa do setor de energia, a Energy China está fazendo investimentos de R$ 50 bilhões em geração de energia renovável e hidrogênio verde. Ainda na área de energia a também estatal China Three Gorges, dona da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira, em São Paulo e outras 16 hidrelétricas no Brasil está investindo R$ 9,4 bilhões em novas usinas eólicas e solares e geração de energia nas 17 hidrelétricas de sua propriedade.

    Na área de transportes, as também estatais chinesas CCCC (Empresa de Construção de Comunicações da China) e a CRCC (Empresa de Construção de Ferrovias da China) estão investindo US$ 24 bilhões no trem intercidades São Paulo-Campinas e na Ponte Salvador-Itaparica. Finalmente, a Cnooc (China National Offshore Oil Corporation), uma das três estatais chinesas na área do petróleo, está investindo R$ 100 milhões em exploração e pesquisa de petróleo em três blocos.

    Os dados divulgados pelas duas pesquisas dão margem a algumas considerações. A primeira é que há alguns anos os investimentos industriais chineses, seja na área de manufatura, seja na área de serviços industriais de utilidade pública, nomeadamente as atividades de geração e distribuição de energia, estão aumentando de forma consistente. A segunda é que parte significativa desses investimentos estão sendo realizados por empresas estatais chinesas.

    Isso nos leva a concluir que tais investimentos não são apenas o resultado de um movimento espontâneo das chamadas forças do mercado, mas refletem uma estratégia planejada do governo chinês seja no sentido de fortalecer seus laços de cooperação com os países em desenvolvimento em geral, seja com o Brasil em particular, seja no sentido de encontrar alternativas para a expansão global das empresas chinesas frente às crescentes restrições aos investimentos diretos chineses nos Estados Unidos e na Europa.

    Tais fatos não deveriam passar desapercebidos pelo governo brasileiro, que deveria aproveitar a oportunidade para alavancar o projeto de desenvolvimento industrial do Brasil lançado em janeiro de 2024 denominado “Nova Indústria Brasil”. Frente à tendência dos Estados Unidos, um tradicional investidor externo no Brasil, de levar de volta para muitas empresas norte-americanas que ao longo das últimas décadas transferiram parte de suas operações fabris para países em desenvolvimento, o Brasil deveria negociar como parte de uma possível adesão ao projeto chinês Cinturão e Rota, principal veículo de internacionalização da economia chinesa, um amplo acordo de investimentos industriais chineses no país, nomeadamente nos setores de alta e média-alta tecnologia.

    Ao invés de apenas aguardar passivamente os anúncios de investimentos chineses, o governo brasileiro deveria atuar proativamente no sentido de atrair esses investimentos para as áreas de maior interesse para o país. Isso poderia ser feito no âmbito da Cosban (Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação) que, pelo lado brasileiro, é coordenada pelo vice-presidente da República, Geraldo Alkimin, que, coincidentemente, é o Ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Um modelo que poderia ser seguido é o mesmo implantado no primeiro governo Lula, quando, no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, sob coordenação do então ministro José Dirceu, foi criado um escritório especializado composto por representantes de diversos ministérios com o objetivo de facilitar a vinda de investimentos estrangeiros para o país.

    Luís Antonio Paulino
    Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

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