Guerra tecnológica dos Estados Unidos contra a China prejudica consumidores e empesas americanas

    A guerra tecnológica dos Estados Unidos contra a China expande-se a cada dia em escopo e profundidade. Começou contra uma empresa chinesa, a Huawei, cujos equipamentos estavam onipresentes nas redes mundiais de telefonia móvel e nomeadamente nas novas redes de Internet 5G, e se expandiu para todas as empresas de tecnologia chinesas. Teve início com restrições à exportação para a China de alguns tipos de semicondutores e tecnologias que supostamente teriam uso dual, civil e militar, e alcançou todos os tipos de semicondutores e tecnologias avançadas que possam pôr em risco a hegemonia tecnológica dos Estados Unidos em qualquer produto ou setor. As restrições à importação pela China de chips se alastraram para a importação de máquinas, equipamentos e tecnologias para a produção de chips e até de pessoal especializado nessas indústrias. Começou com a proibição de exportação de chips avançados pelas empresas norte-americanas e alcançou qualquer empresa no mundo que exporte para a China utilizando algum tipo de tecnologia desenvolvida ou de propriedade dos Estados Unidos. Começou com restrições na área de microeletrônica e cresceu para todas as áreas que utilizem tecnologia de ponta. O mais recente avanço foi na área de biotecnologia.

    Segundo a revista The Economist (17/4), “A Lei de Biossegurança, que tem apoio bipartidário no Congresso, propõe encerrar contratos governamentais para empresas que contam com empresas chinesas de biotecnologia como clientes ou fornecedores. As autoridades americanas já disseram que querem proteger uma “pequena área” de tecnologias sensíveis com uma “cerca alta”. Esse projeto de lei ilustra que a área está cada vez maior, com consequências lamentáveis para todo o mundo, inclusive os consumidores americanos. Utiliza a ameaça de terminar contratos federais lucrativos para cortar os laços das empresas americanas com sequenciadores genômicos chineses, fabricantes de máquinas de sequenciamento e fabricantes de medicamentos de moléculas grandes, como injetáveis para perda de peso. Estende a proibição a qualquer empresa de biotecnologia com sede num país adversário e menciona quatro empresas chinesas nominalmente.”

    Ainda segundo a revista “Um dos alvos é uma empresa de sequenciamento chamada BGI, anteriormente conhecida como Beijing Genomics Institute. A BGI é o maior sequenciador de DNA humano do mundo e opera em mais de 100 países. Fornece testes pré-natais e kits de diagnóstico para Covid-19 e outras doenças. A empresa, tal como os seus rivais, oferece exames de saúde baratos em troca de manter os dados anônimos dos seus pacientes. Os dados, por sua vez, são usados no desenvolvimento de medicamentos de ponta”. O que deixou os norte-americanos particularmente enfurecidos foi o fato de as máquinas da MGI Tech, uma subsidiária da gigante chinesa BGI que fabrica equipamentos de sequenciamento de genoma, terem sido instaladas em hospitais europeus, conforme relata a revista The Economist (25/4).

    Para justificar a nova lei, os legisladores afirmaram que as empresas de biotecnologia chinesas roubaram propriedade intelectual (IP) e colaboraram com o Exército de Libertação Popular (PLA) e com a repressão do governo chinês aos uigures. Nenhuma das alegações faz sentido, a começar pela questão da propriedade intelectual. Não há ninguém que mais proteja sua propriedade intelectual do que as empresas farmacêuticas norte-americanas e europeias e se, elas próprias, estão terceirizando algumas de suas atividades para empresas chinesas é porque não veem nenhum tipo de risco para seus interesses. Ao contrário, a grande maioria das startups norte-americanas na área de biotecnologia se apoiam em fabricantes chineses de insumos para viabilizar suas atividades. O resultado dessas proibições será o aumento de custos para os consumidores norte-americanos na contramão da promessa de Biden de baixar o custo dos medicamentos e perda de competitividade das empresas americanas do setor, principalmente as menores, frente a seus concorrentes de outras regiões. Na ânsia de atirar na China, os Estados Unidos estão dando tiros nos próprios pés.

    Luís Antonio Paulino
    Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

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