Juntamente com o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC 3), o governo lançou, no mesmo dia, o Plano de Transformação Ecológica, que, segundo seus formuladores, tem potencial para revolucionar a economia brasileira. Segundo os idealizadores do plano, elaborado no Ministério da Fazenda, “É um plano para promover o crescimento econômico do Brasil, um crescimento mais distributivo e que busca estabelecer uma nova relação com o meio ambiente”. Oxalá assim o seja, uma vez que nas últimas duas décadas não faltaram planos para acelerar o desenvolvimento (PAC 1 e 2) e salvar o meio-ambiente (Plano Amazônia Sustentável – PAS), cujos resultados ficaram, para falar o mínimo, bem aquém do pretendido.
Segundo seus idealizadores, o plano tem três grandes objetivos: aumentar a produtividade da economia brasileira incorporando inovação e tecnologia, produzir crescimento a partir de uma nova relação com o ambiente e de modo a proporcionar “que todos ganhem”. Não se trata de um plano apenas de descarbonização da economia afirmam eles. “A ideia é que a descarbonização seja uma oportunidade para a gente promover um adensamento tecnológico do setor produtivo. Trata-se de desenvolvimento econômico. O meio ambiente é um elemento central do plano, mas não é um plano ambiental. É um plano para promover o crescimento econômico do Brasil, um crescimento mais distributivo e um crescimento que busca estabelecer uma relação nova com o meio ambiente”.
Segundo matéria do Estadão (26/8), “O pontapé inicial foi dado nesta semana com a apresentação do parecer da senadora Leila Barros (PDT-DF), relatora do projeto de lei que cria um mercado regulado de crédito de carbono no País. A proposta regulamenta como vai funcionar “o direito” das empresas de poluir, com base em um teto para a emissão, estimado em 25 mil toneladas de CO2 por ano. O projeto é a aposta principal de Haddad para um novo plano de desenvolvimento econômico para o País crescer mais rápido e com baixa pegada de carbono. “O mercado regulado de carbono é inspirado em práticas internacionais, como as da União Europeia. Não se trata apenas de um mercado de crédito, mas de colocação de um limite de emissões”, afirma Rafael Dubeux, que está à frente dessa agenda no Ministério da Fazenda. O projeto define que as instalações que excederem o limite deverão comprar esse direito por meio de cotas”.
Não parece, entretanto, que o melhor caminho para o Brasil entrar em uma nova fase de desenvolvimento seja começar vendendo o direito de poluir e estabelecendo impostos seletivos para compensar as externalidades negativas das grandes empresas poluidoras. As empresas brasileiras já atuam em um ambiente internacional altamente protecionista, onde medidas ambientais são utilizadas, na maior parte das vezes, como barreiras à entrada dos produtos brasileiros em mercados altamente protegidos. O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos do mundo e um dos que mais tributam a produção. O custo de capital pago pelas empresas brasileiras provavelmente é o mais elevado do mundo. Imaginar, portanto, que vai se dar um novo impulso ao desenvolvimento do país aumentado ou criando impostos, mesmo que seletivos, e aumentando, assim, os custos de produção enquanto as grandes potências industriais como Estados Unidos, China e Índia não fizeram e nem pretendem fazer nada disso e, além disso dão enormes subsídios para sua indústria, não parece ser uma boa ideia.
Não resta dúvida de que o Brasil tem condições privilegiadas nessa corrida para a transição energética que o mundo passou a exigir, seja pelas características de nossa matriz energética (86% da geração de energia elétrica baseada em recursos renováveis), seja pela disponibilidade de recursos energéticos não poluentes e recursos minerais essenciais para as novas tecnologias verdes (baterias elétricas, hidrogênio verde, etc.)
Daí, entretanto, colocar a agenda ambiental no centro de um novo plano de desenvolvimento para o Brasil vai uma enorme distância, mesmo porque, não se pode negar, como comprova a experiência histórica dos países desenvolvidos e mais recentemente da própria China, que o chamado progresso, que é o que supostamente se busca com um plano de desenvolvimento, é um processo bastante contraditório e exige o tempo que a sociedade faça escolhas que embutem riscos, como está agora evidente no caso da exploração de petróleo na Margem Equatorial, para tal agenda.
Colocar, portanto, a questão ambiental no centro de uma agenda de desenvolvimento, como propõe o Plano de Transformação Ecológica, é tentar iniciar uma corrida amarrando, de saída, um peso nos próprios pés, mesmo porque a legislação brasileira já impõe um sem número de exigências ambientais para qualquer novo investimento que não se vê em outros lugares do mundo. Brasil e Paraguai são, por exemplo, os dois únicos países do mundo que impõem a necessidade de reserva legal com percentual de área delimitada em propriedades privadas, que em nosso caso é de 80% em áreas de florestas, 35% no Cerrado e 20% em áreas de campos gerais.
Isso não quer dizer que a questão ambiental deva ser ignorada em um futuro plano de desenvolvimento, nem que se deva desconsiderar as oportunidades que a chamada transição energética pode abrir para o país nas décadas vindouras. Não se pode desconhecer, entretanto, que nenhum país hoje desenvolvido, ou mesmo a China, em rápido processo de desenvolvimento, subordinaram, no passado, ou subordinam, hoje, sua agenda de desenvolvimento à questão ambiental por mais importante que possa ser. Diante das restrições ao fornecimento de petróleo, decorrentes da guerra na Ucrânia, tanto os Estados Unidos quanto a China recorreram imediatamente ao aumento da geração de energia com base na queima do carvão, muito mais poluente, para não travar suas economias e já avisaram que o pico de utilização de combustíveis fósseis só vai ocorrer em algumas décadas, ou seja, não só vão continuar jogando CO2 na atmosfera como vão aumentar ainda mais o despejo.