COP 29 frusta países em desenvolvimento

(Foto: Agência Brasil - EBC)

A Rodada de Doha, da OMC, iniciada em 2001, foi batizada de “Rodada do Desenvolvimento” porque, supostamente, iria finalmente resolver os problemas deixados para trás nas rodadas anteriores, nomeadamente, a exclusão do comércio de bens agrícolas das regras do comércio internacional, que permitia aos países ricos imporem tarifas superiores a 300% nas exportações de produtos agrícolas dos países em desenvolvimento, oferecer subsídios condenados pela OMC para seus produtores agrícolas locais e estabelecer barreiras não tarifárias de todo tipo às exportações agrícolas dos países pobres. Depois de sucessivas tentativas frustradas para se chegar a um acordo, ironicamente, apesar do nome, a tal Rodada do Desenvolvimento acabou em 2015, na Conferência de Nairobi, sem chegar a acordo nenhum porque os países ricos se negaram a abrir seus mercados para as exportações agrícolas dos países pobres. O Acordo de Livre-Comércio entre o Mercosul e a União Europeia vem se arrastando há décadas pelo mesmo motivo.

Algo semelhante ocorreu na COP 29, realizada em Baku, capital do Azerbaijão, no último mês de novembro. Apelidada de COP do Financiamento, a conferência foi marcada pela resistência dos países ricos de colocarem a mão no bolso, porque supostamente iria enfrentar a questão do financiamento pelos países ricos de ações visando mitigar os efeitos do aquecimento global nos países pobres e permitir que realizem a transição para a chamada “economia verde”, conforme determina o Acordo de Paris, que prevê que os maiores responsáveis pela crise climática (os países ricos) financiem recursos para a transição energética, mitigação, adaptação e redução de emissões de gases do efeito estufa nos países em desenvolvimento.

Apesar da estimativa de que seriam necessários pelo menos US$ 1 trilhão por ano para enfrentar o problema, os países ricos, depois de um esforço desesperado na madrugada de encerramento do encontro para salvar a face do evento, concordaram com a cifra de US$ 300 milhões/ano sem especificação de onde e em que condições viria esse dinheiro. O acordo anterior previa a cifra de US$ 100 milhões por ano, valor que nunca foi atingido em todo o período em que essa meta vigeu.

Não é coincidência que os países ricos organizem esses verdadeiros circos para demonstrar preocupação com problemas globais que no limite afetam de maneira desproporcional os mais pobres, mas na hora de assumir compromissos efetivos à altura de suas responsabilidades pela criação dos problemas simplesmente desconversem e procurem empurrar a conta para os países em desenvolvimento.

A verdade é que em nenhum dos grandes temas que afetam a humanidade, sobretudo os mais pobres, como fome, aquecimento global, guerras e pandemias os países ricos estão dispostos a sacrificar seus interesses em prol do bem comum. Na hora “H” os seus interesses nacionais sempre falam mais alto e sempre dão um jeito de se eximir das suas responsabilidades.

O problema climático é real, haja vista a sucessão de eventos climáticos extremos que vêm ocorrendo nos últimos anos causando mortes, destruição e dificuldades econômicas sobretudo para os países e segmentos da população mais pobres em todo o mundo. Em sua longa história de evolução o planeta Terra já passou por diversas mudanças climáticas extremas que levaram à extinção de diversas espécies, como foi o caso dos dinossauros. Incapazes de se adaptar às mudanças acabaram extintos. Na história humana também é possível encontrar casos de civilizações que pela falta de capacidade de se adaptar a mudanças no clima acabaram extintas, como foi o caso da civilização Maia, na América Central, que por volta do ano 800 d.C. passou por um século de secas extremas. Quando os espanhóis chegaram alguns séculos depois para conquistar a região, o clima já havia feito o serviço.

A ausência de regras e instituições que permitam as adaptações necessárias às mudanças climáticas pode provocar o colapso da sociedade. Nesse sentido, a incapacidade dos países ricos de mudar seu comportamento e estilo de vida mesmo diante das evidências que se acumulam sobre a gravidade da questão climática é preocupante.

Luís Antonio Paulino
Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

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