“bets”: a economia da regressão ética

    (Imagem: Poder360)

    Diz-se que os governos praticam a economia da regressão ética  quando se aliam à destruição silenciosa da renda das famílias e da saúde mental coletiva, tolerando ou mesmo incentivando práticas nocivas às pessoas e às famílias com o objetivo de utilizá-las como fato gerador de impostos.

    No caso específico das “bets”, não só os governos, mas a maioria dos clubes de futebol embarcaram sem o menor pudor nesse esbulho da economia popular, isso para não falar de muitas celebridades midiáticas, jogadores e artistas, emprestando seus nomes e prestígio sobretudo entre os mais pobres para arrastá-los para um vício do qual, depois que se entrou, é difícil sair.

    Pressionado pelo lobby das bets no Congresso Nacional, o governo federal, ao invés de proibir, concordou em regulamentar a atividade, sem avaliar seu impacto sobre a saúde pública e a economia popular, tornando-se indiretamente sócio dos empresários do setor. Como o exemplo vem de cima, os prefeitos, sempre às voltas com a penúria fiscal, viram na municipalização das bets uma possível fonte fácil de receita tributária. Uma das principais bandeiras da última Marcha dos Prefeitos realizada em Brasília, no mês de maio, foi a da municipalização das bets, uma vez que a lei permite apenas à União e aos Estados a exploração de jogos de azar.

    Quase todos os dias lemos na imprensa a descrição de casos de pessoas que perderam emprego e todas suas economias por causa no vício nas bets. Três matérias do Estadão, no mês de maio, abordaram o tema.

    Matéria assinada por Fábio Gallo (23/5), afirma: “Algo paradoxal está acontecendo no Brasil à vista de todos, e que deveria ser tratado como uma inversão moral de prioridades. Assistimos há pouco a milhares de prefeitos marchando a Brasília para exigir a liberação de apostas online em nível municipal, como se fosse algo saudável para resolver as finanças públicas. No entanto, não estamos nos dando conta de que o Brasil está prestes a repetir um dos piores erros em políticas públicas: legalizar um vício sem dar a devida atenção a todos os seus aspectos e antes de estruturar um sistema para tratar suas consequências.”

    Ainda de acordo com a matéria, “Segundo dados do Banco Central, os brasileiros movimentam entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões por mês em apostas online. São estimados em mais de 2 milhões de pessoas, com sintomas que vão de depressão à compulsão financeira. Dados internacionais indicam que os custos sociais do jogo podem chegar a 1% do PIB. Se aplicarmos isso ao Brasil, falamos de um impacto anual potencial entre R$ 30 bilhões e R$ 100 bilhões.”

    Matéria assinada por Iander Porcella (06/5) no mesmo Estadão afirma: “O tributarista Menndel Macedo defende a legalização das loterias municipais como um caminho mais eficaz e célere para o aumento da arrecadação e diz que a receita potencial desse mercado poderia ser, até mesmo, uma possível alternativa à taxação de grandes fortunas, já cogitada pelo governo. “Regulamentar as bets no âmbito municipal é reconhecer uma realidade econômica que já existe e que, inclusive, já foi objeto de regulamentação federal. Negar aos municípios essa competência fere o princípio da autonomia e atrasa o aproveitamento de uma fonte legítima de receita pública. É uma medida inteligente, moderna e que não amplia a carga tributária sobre quem já contribui”, afirmou Menndel à Coluna.”

    Uma terceira matéria assinada por Jayanne Rodrigues (24/5) afirma que “No Brasil, 54% dos gestores dizem que os colaboradores aproveitam o horário de descanso, como a pausa do almoço, para apostar. A informação é de uma pesquisa divulgada neste ano pela Creditas Benefícios, em parceria com Wellz by Wellhub e Opinion Box, que ouviu 405 gestores e profissionais de RH. Sobre os impactos no ambiente de trabalho, 66% apontam que o vício compromete a saúde mental e física dos funcionários. Em seguida, aparecem a queda na produtividade, com 59%, o aumento da rotatividade, 21%, e a piora na reputação da empresa, 16%.”  O fenômeno também chegou às salas de aula com relatos de professores sobre casos de alunos fazendo apostas durante as aulas. 

    Luís Antonio Paulino
    Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

    Não há posts para exibir

    Deixe um comentário

    Escreva seu comentário!
    Digite seu nome aqui