Frente às ameaças generalizadas do governo Trump de punir qualquer país, aliado ou não, que na sua opinião esteja prejudicando os Estados Unidos, seja pela imposição de tarifas de importação elevadas para as mercadorias produzidas nos Estados Unidos, seja não tomando medidas para impedir a imigração ilegal ou contrabando de drogas, nomeadamente o fentanil que se tornou um grave problema se saúde pública nos Estados Unidos, os países da América Latina, nomeadamente os da América Central e Caribe, são os que estão em posição mais vulnerável.
Seja porque é de onde sai ou por onde passa a maior parte de imigrantes ilegais para os Estados Unidos, seja porque são os principais corredores para a entrada de drogas ilícitas no território americano, seja porque são os que mais dependem dos Estados Unidos para suas exportações de produtos primários, seja porque não têm capacidade de retaliar, os países da América Latina se tornaram alvos fáceis para a agressiva política externa de Trump. Com nomeação de Marco Rúbio, filho de imigrantes cubanos, para a Secretaria de Estado dos Estados Unidos, o equivalente ao ministério das Relações Exteriores, a América Latina ganha destaque na política externa dos Estados Unidos, mas é vista mais como um problema do que uma solução.
O caso recente da Colômbia, que ao se recusar a receber voos militares com deportados dos Estados Unidos foi ameaçada de forma exemplar com tarifas punitivas sobre suas exportações, sendo obrigada a recuar pelo receio do impacto negativo sobre a sua economia, mostra que a América Latina, diferentemente de Canadá, União Europeia ou a China, que têm como se defender ou pelo menos retaliar, está em posição fragilizada.
Como mostra matéria do Estadão (02/2/2025), o México é de longe o país com mais imigrantes ilegais nos Estados Unidos (cerca de 4 milhões, segundo o Pew Research Center), e os EUA são o destino de mais de 70% das suas exportações. El Salvador, o segundo da lista, exporta 40% de seus produtos para os Estado Unidos. Na Guatemala, a terceira colocada, também 32% de suas exportações vão para o território americano e Honduras, o quarto, exporta 51%. No caso da Colômbia, 25,8% de suas exportações vão para os Estados Unidos, principalmente café e flores.
O Brasil, que depende menos do comércio dos Estados Unidos – 12% das exportações e 15% das importações – vem sendo reiteradamente citado em todos os discursos de Trump sobre comércio como país que taxa demais os produtos norte-americanos e está na sua lista de países que “querem mal” aos Estados Unidos.
A atitude do Panamá, prometendo sair da Iniciativa Cinturão e Rota da China e entregando os dois portos operados por uma empresa de Hong Kong nos dois lados do canal para um fundo de investimento dos Estados Unidos (Black Rock), sem, contudo, aplacar a disposição de Trump de retomar o canal para os Estados Unidos, pelo meio que for, mostra o quanto a América Latina é, mais do que nunca, quintal dos Estados Unidos.
Segundo Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, não há muito o que fazer. Conforme declarou ao Estadão na citada reportagem, o episódio da Colômbia serve de exemplo para outros países. “Não adianta querer falar muito se o país não tem poder . Os países estão usando a força para obter resultados políticos. Essa é a nova regra hoje nos EUA.”
Como evidenciou o caso da Colômbia e o mais recente bate-boca do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy, com Trump, de nada adianta criar uma situação de confronto com Trump. A diplomacia precisa agir de forma silenciosa.
A bem da verdade, a situação poderia ser pior. Como revelou a já citada matéria, “Segundo dados do Council on Foreign Relations, centro de estudos com sede em Nova York, o mercado da China representava menos de 2% das exportações da América Latina, em 2000, mas cresceu a uma taxa média anual de 31% nos oito anos seguintes. Em 2021, o comércio ultrapassou US$ 450 bilhões, segundo o governo chinês, e economistas dizem que as cifras podem chegar a US$ 700 bilhões, em 2035.”
O complexo portuário de Chancay, no Peru, construído pela China, interligando China e América Latina, inaugurado em novembro de 2024, será, em alguns anos, o maior porto comercial da América do Sul. Conforme informou a BBC New (15/11/2024), “O complexo portuário de Chancay fica cerca de 70 km ao norte da capital peruana, Lima. É um projeto superlativo, liderado pela companhia marítima estatal chinesa Cosco Shipping Company e com investimentos totais estimados em US$ 3,4 bilhões (cerca de R$ 19,7 bilhões).” Conforme destacou a referida reportagem, “Com o complexo portuário, a China aumenta sua capacidade de desembarque de mercadorias na América do Sul e de transporte dos produtos importados da região, principalmente minérios, como lítio e cobre, e produtos agrícolas, como a soja. (…) Além da vantagem em termos geográficos, o grande calado da baía de Chancay confere ao porto capacidade de receber os maiores navios do mundo, que podem transportar até 24 mil contêineres, conhecidos no setor de navegação como TEU (“unidade equivalente a 20 pés”, na sigla em inglês). Assim, o novo porto deve dar às empresas de navegação a possibilidade de embarcar maiores quantidades de mercadorias a um custo mais baixo.”
A recente derrota do trumpismo para eleição do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), em que Brasil e outros países da América Latina conseguiram fazer com que o Paraguai desistisse de indicar seu chanceler como secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), visto como um representante do trumpismo, apoiando o nome do Suriname, mostra que quando os países da região se articulam é possível resistir às pressões externas de maneira mais efetiva.