Aumento das tensões políticas internacionais desencadeia nova corrida armamentista

(Foto: Revista Crusoé)

Como noticiou o Estadão[1] , com o aumento das tensões internacionais, “Estados Unidos, Rússia, Paquistão, Índia, Reino Unido, Israel, França e Coreia do Norte vêm aumentando o número de ogivas nucleares implantadas, segundo monitoramento da Federação de Cientistas Americanos (FAS). De acordo com a matéria, “por “implantadas” se entende como as ogivas já instaladas em mísseis ou prontamente disponíveis em instalações militares para serem utilizadas rapidamente. Diferentemente das ogivas armazenadas, que requerem tempo para serem preparadas e colocadas para uso (…) ao todo, os nove países possuem 12.121 ogivas, das quais 9.585 estão em estoques militares, e dessas 3.904 estão implantadas em mísseis e bombardeiros. Cerca de 2.100 ogivas dos EUA, Rússia, Reino Unido e França estão em alerta máximo e podem ser utilizadas em um curto espaço de tempo”. Ainda segundo a matéria, “Essa corrida armamentista nuclear acontece em um momento em que a diplomacia perdeu espaço para novos conflitos e guerras cada vez mais destrutivas. Em 2023, o número de conflitos envolvendo forças de Estado atingiu o recorde de 59 contra 55 do ano anterior, segundo o Programa de Coleta de Dados de Conflitos da Universidade de Uppsala, na Suécia.”

Fruto da recente mudança geopolítica dos Estados Unidos, a Europa também começa a pensar em seu próprio escudo nuclear. Matéria da revista The Economist, intitulada “A Europa pensa na ‘impensável’ bomba nuclear para se defender sem os EUA”, publicada pelo Estadão[2], informa que a Polônia quer a cooperação da França para ‘complementar o escudo nuclear’ contra agressões à Europa. A matéria especula sobre as diversas possibilidades. Segundo a matéria, [Donald] Tusk [primeiro-ministro da Polônia] “não estava propondo uma bomba nuclear polonesa — pelo menos não imediatamente: “O caminho para isso seria muito longo, e teria que haver um consenso”. Em vez disso, ele estava respondendo a um chamado de Friedrich Merz, o novo chanceler da Alemanha, para negociações com o Reino Unido e a França a respeito de “complementar o escudo nuclear americano”. Em 5 de março, Emmanuel Macron, presidente da França, anunciou um “debate estratégico do uso de nosso poder de dissuasão para proteger nossos aliados no continente europeu”.

Outra matéria publicada pelo Estadão[3], intitulada “Gigantes da defesa rearmam Europa com plano de aumento militar da EU”, informa que “A União Europeia anunciou planos para aumentar seus gastos com defesa em € 800 bilhões (R$ 5 trilhões), disse esta semana a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, revelando o plano ReArm Europe. O plano inclui €150 bilhões (R$ 941,5 bilhões) em empréstimos para ajudar os estados-membros a comprar defesas aéreas, artilharia, mísseis, “drones de munição” e sistemas anti-drone, além de atender a outras necessidades como cibersegurança e mobilidade.”

Esse nova corrida armamentista europeia está diretamente relacionada aos novos rumos tomados pela Guerra na Ucrânia depois da posse de Donald Trump na presidência dos Estados Unidos. Adotando uma posição oposta a de seu antecessor, de apoio irrestrito à Ucrânia na guerra contra a Rússia, Trump, aparentemente, inclinou-se para uma posição mais favorável à Rússia, a menos que a Ucrânia concorde em entregar aos Estados Unidos o equivalente a US$ 500 bilhões em recursos naturais como compensação à ajuda já oferecida à Ucrânia na guerra contra os russos, que mal chega à quinta parte desse valor. Essa mudança de postura dos Estados Unidos despertou entre os europeus o receio de que a Rússia, caso vença a guerra contra a Ucrânia, possa se voltar para outros países do Leste Europeu que com o fim da União Soviética, em 1991, tornaram-se independentes e aderiram à Otan.

Na verdade, essa mudança geopolítica dos Estados Unidos põe em xeque todo o arranjo político e institucional construído ao final da Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos estacionaram suas armas e suas tropas em território europeu para confrontar a ex-URSS durante o período da Guerra Fria. Como se vê no quadro abaixo, os Estados Unidos mantêm 100 bombas atômicas nos países aliados da Europa e a França e o Reino Unido que possuem suas próprias armas nucleares, que em tese, só podem ser usadas no caso de ataques ao seu próprio território. Caso os Estados Unidos retirem ou diminuam sua presença nuclear na Europa, outros países da União Europeia poderiam ficar expostos a um eventual ataque russo, o que levou Alemanha e Polônia a cogitarem construir seu próprio arsenal nuclear, bem como à iniciativa do presidente francês.

O fato é que um mundo cada vez mais fragmentado do ponto de vista econômico, torna-se também mais instável do ponto de vista geopolítico. O protecionismo e o nacionalismo exacerbado são terrenos férteis para o aumento das tensões geopolíticas globais que, como já ficou provado em situações anteriores, podem levar à deflagração de conflitos bélicos de grande proporção. Afirmações, como a do presidente americano, de que  os Estados Unidos “precisam da Groenlândia” e que vão tomar à força o Canal do Panamá, recolocando novamente na ordem do dia uma nova era de expansão territorial, subvertendo a ordem global baseada em regras para um nova ordem na qual os fortes dominam e o poder faz a razão e a divisão do mundo em áreas de influência, que terão como consequência inevitável a eclosão de novos conflitos internacionais de grandes proporções, para descambarem para novos conflitos bélicos é apenas um passo.


[1]   https://www.estadao.com.br/internacional/paises-reforcam-seus-arsenais-nucleares-em-meio-ao-aumento-de-conflitos-no-mundo/

[2] https://www.estadao.com.br/internacional/a-europa-pensa-na-impensavel-bomba-nuclear-para-se-defender-sem-os-eua/

[3] https://www.estadao.com.br/internacional/a-europa-pensa-na-impensavel-bomba-nuclear-para-se-defender-sem-os-eua/

Luís Antonio Paulino
Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

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