Catharina Obeid e Gonçalo Junior / Agência Estado
Os gritos por igualdade salarial que marcaram o título dos Estados
Unidos no Mundial de Futebol Feminino têm eco no Brasil. Por aqui,
homens também ganham mais do que mulheres. Nos grandes clubes, eles
recebem muito mais mesmo. Enquanto a folha de pagamentos dos gigantes de
São Paulo giram entre R$ 10 milhões, os gastos com os times femininos
ainda são da ordem de R$ 100 mil. É uma diferença de cem vezes.
Portanto, brutal. No caso dos times menores, a remuneração das jogadoras
oscila e é compatível com a dos homens das Séries B, C e até D do
Campeonato Brasileiro.
De acordo com informações do Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (Caged) da Secretaria da Previdência e Trabalho do
Ministério da Economia (antigo Ministério do Trabalho), os salários de
mulheres são de R$ 2.556,34. No caso dos homens, R$ 5.577,53. Ou seja:
os homens ganham 118% a mais. A amostragem é de dez mil profissionais
pesquisados.
“Elas têm salários comparados com jogadores da Série B ou até uma série
inferior, infelizmente”, diz Thaís Picarte, goleira do Santos e
vice-presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais de Futebol do
Município de São Paulo. “Essa diferença salarial é um absurdo. Pior é
que não sei se a gente vai conseguir igualar isso algum dia”, diz
Cristiane, do São Paulo. “Lá fora, a situação é a mesma. Dificilmente,
você encontra uma atleta que ganhe 15 mil euros ou uns R$ 60 mil”, diz a
ex-jogadora do PSG, o mesmo time de Neymar.
Questionado pelo Estado sobre a diferença salarial, Marco Aurélio Cunha,
coordenador das seleções femininas da CBF, citou jogos recentes que não
tiveram cobrança de ingressos do futebol feminino. “São unidades de
negócio diferentes. Um é consolidado e lucrativo no País; o outro está
em formação e ainda precisa de investimentos. Eles podem ser iguais
financeiramente?”, questiona.
O professor Eduardo Carlassara, doutorando da Escola de Educação Física e
Esporte da USP, concorda que o modelo de negócio precisa ser repensado.
“A diferença de remuneração entre os gêneros está atrelada à procura e
ao preço dos ingressos. Na Rio-2016, os ingressos para as competições
masculinas eram 33% mais caros do que as femininas. Isso pode
influenciar na remuneração”, explica.
Além dos baixos salários, muitas não têm registro profissional. Entre os
52 clubes que disputam o Brasileiro feminino, menos de 10% assinam a
carteira das atletas. Sem registro, a jogadora não tem acessos aos
direitos trabalhistas. Pior: não consegue recorrer aos benefícios do
INSS quando sofre um contusão grave, por exemplo. “Uma colega ficou nove
meses esperando uma ressonância e mais de um ano para conseguir a
cirurgia”, conta Thais.
Essas dificuldades não se limitam aos clubes menores ou equipes
recém-criadas por exigência da CBF, mas atingem as atletas da seleção
que permanecem no País. As jogadoras do Corinthians, por exemplo,
assinaram um acordo de prestação de serviços com duração de um ano.
Marco Aurélio Cunha reconhece a falta de profissionalização no Brasil.
“Ainda é uma atividade semiprofissional. Se exigirmos isso (carteira
assinada) de todos, não haverá chance de sobrevivência de muitos
clubes”, argumenta o dirigente.
Aline Pellegrino, diretora de futebol feminino da Federação Paulista de
Futebol (FPF), defende que todas as condições precisam melhorar. “Temos
de focar em aumentar o número de campeonatos, principalmente nas
categorias de base, e focar na estrutura para os treinamentos e
partidas”, afirma.