Golpe militar no Niger

    Um golpe militar no Niger, em 26 de julho, derrubou o presidente eleito em 2021, Mohamed Bazoum. O Niger era o último estado  parcialmente funcionando na região depois da recente tomada do poder por militares no Mali e em Burkina Faso. Os três países fazem parte do Sahel, que é a região árida da África, situada entre o deserto do Saara e as terras mais férteis na região equatorial do continente, que forma um corredor quase ininterrupto do Atlântico ao Mar Vermelho, numa largura que oscila entre 500 e 700 km.

    Grande parte dessa região é dominada pelos movimentos jihadistas. Nos 12 meses até Junho, mais de 22 mil africanos morreram em violência relacionada com os jihadistas, 50% mais do que no ano anterior e o dobro do número de mortos no Iraque em 2014, quando o Estado Islâmico estava no seu auge. Esses movimentos se sustentam recrutando jovens vivendo em condições de miséria e submetidos à brutalidade dos exércitos locais.

    Como afirma matéria da revista The Economist, “O jihadismo é tanto um sintoma do colapso social e econômico como uma causa. No caso do Sahel, o aumento da população e as alterações climáticas criaram uma competição de soma zero por terras e outros recursos, bem como desestabilizaram a migração interna. Governos corruptos e incompetentes intensificam estes problemas, criando burocracias predatórias e exércitos brutais que alimentam a jihad ao agravar as tensões sectárias e ao abusar das minorias étnicas. A fadiga pós-colonial e o cinismo em relação ao Ocidente contribuíram para a conflagração”.

    O enfrentamento do problema passa, portanto, pela melhoria das condições de vida da população pobre e pela maior oferta dos serviços do governo, estratégia que estava sendo seguida com sucesso pelo governo do Niger. O golpe militar dado sob o pretexto de que o governo não estava sendo suficientemente duro com o jihadistas, ao invés de resolver o problema tende a agravá-lo, como atesta o aumento da violência no Mali e em Burkina Faso, depois da recente tomada do poder pelos militares. O problema é ainda mais grave porque o aumento da violência tende a se espalhar ainda mais pela região, onde a presença desses grupos radicais é cada vez maior.

    O testemunho de um jovem militante jihadista dá a dimensão do problema. Conforme relata a mencionada reportagem da The Economist, “Questionado sobre a razão pela qual se juntou a um grupo radical, Boubacar Moussa não menciona religião. Em vez disso, ele enfatiza motivos mais terrenos. Na sua aldeia ele não tinha nada. Com os jihadistas: “Tudo o que você quiser, os patrões vão te dar…dinheiro, mulheres, carne e uma moto”. Não importa a luta sagrada para construir um califado; numa região pobre como o Sahel, a pilhagem pode ser mais lucrativa do que o trabalho honesto.” Qualquer semelhança com o que ocorre na América Latina em áreas dominadas pelo tráfico de drogas e pelo crime organizado e brutalizadas pela polícia não é mera coincidência.

    Luís Antonio Paulino
    Luís Antônio Paulino é professor doutor associado da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro da equipe de colaboradores do portal “Bonifácio”.

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