Para Donald Trump todos querem “roubar” os Estados Unidos, não importa se sejam adversários, como a China, ou aliados como o México, Canadá e União Europeia. E todos se preparam para tentar conter os danos que um eventual aumento generalizado de tarifas por parte dos Estados Unidos pode causar em suas respectivas economias. Obviamente isso só reforça a tendência do isolacionismo dos Estados Unidos sob o comando de Trump, com todas as consequências negativas não só para o mundo como também para os próprios Estados Unidos.
Os chineses entendem que uma nova escalada tributária dos Estados Unidos em relação a suas exportações será prejudicial não só para sua economia, como também para a própria economia norte-americana, que depende do fornecimento pela China de milhares de produtos de consumo baratos para manter sua inflação sob controle e do fornecimento de insumos industriais para garantir sua economia funcionando.
Entretanto, diferentemente de fevereiro de 2018, quando Trump iniciou a guerra comercial contra a China em seu primeiro mandato, os chineses estão melhor preparados para conter os eventuais efeitos que uma nova escalada protecionista poderia causar em sua economia. Os dirigentes chineses têm dito que estão prontos para trabalhar com Trump, mas se preparam para o pior. Em encontro com o presidente Joe Biden na reunião da APEC no Peru, no mês de novembro, o presidente Xi Jinping afirmou que “A China está pronta para trabalhar com uma nova administração dos EUA para manter a comunicação, expandir a cooperação e gerenciar as diferenças, de modo a se esforçar por uma transição estável das relações China-EUA para o benefício dos dois povos”. Mas, ao que tudo indica, Trump aposta na confrontação com a China como o caminho para “fazer a América grande de novo”.
Segundo o New York Times (27/11), “Desde a campanha até as nomeações para o gabinete Trump deixou claro acreditar que um confronto com a China sobre comércio e tecnologia é inevitável. No primeiro governo Trump, o governo chinês tomou medidas principalmente simbólicas e equivalentes após as tarifas e restrições comerciais dos EUA. Desta vez, a China está pronta para intensificar suas respostas, dizem os especialistas, e pode apontar contramedidas agressivas e direcionadas às empresas americanas.”
Segundo o jornal, “A China teve tempo para se preparar. Durante o primeiro mandato de Trump, as autoridades em Pequim começaram a redigir leis que refletem as táticas dos EUA, permitindo-lhes criar listas negras e impor sanções às empresas americanas, cortando-as de recursos críticos. O objetivo tem sido usar o status da China como o chão de fábrica do mundo para exigir punição. Desde 2019, a China criou o que chamou de “lista de entidades não confiáveis” para penalizar empresas que prejudicam os interesses nacionais, introduziu regras para punir empresas que cumprem as restrições dos EUA a entidades chinesas e expandiu suas leis de controle de exportação. O alcance mais amplo dessas leis permite que Pequim potencialmente sufoque o acesso global a materiais críticos como terras raras e lítio – componentes essenciais em tudo, desde smartphones a veículos elétricos. As novas ferramentas fazem parte do que uma publicação do Partido Comunista descreveu como um esforço para “fornecer apoio legal para combater o hegemonismo e a política de poder e salvaguardar os interesses do país e do povo”. De acordo com o Nikkei Asia (16/11), “O retorno iminente do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump ao cargo alimentou uma grande recuperação entre as ações de empresas fabricantes de semicondutores na China, com políticas americanas mais duras acelerando o esforço de Pequim para reforçar sua indústria doméstica de chips.”
Mas não são apenas os adversários dos Estados Unidos que estão preocupados com o retorno de Donald Trump à presidência norte-americana. Segundo noticiou o jornal Estadão (18/11), “A perspectiva para a economia da Europa tem sido decepcionante. Após a eleição presidencial de Donald Trump, ela piorou. Espera-se, além de profunda incerteza sobre as políticas do futuro governo americano em relação a comércio, tecnologia, Ucrânia e mudanças climáticas, um recuo nos investimentos que vão prejudicar o crescimento do bloco. O lançamento de uma possível guerra tarifária pelos EUA, o maior parceiro comercial e aliado mais próximo da União Europeia (UE) e do Reino Unido, afetaria os principais setores, como o automobilístico, o farmacêutico e o de máquinas. E a necessidade de aumentar os gastos militares devido a dúvidas sobre as garantias dos EUA na Europa sobrecarregaria ainda mais os orçamentos nacionais e aumentaria os déficits. Além disso, a atitude mais conflituosa do presidente eleito em relação à China pode pressionar a Europa a escolher um lado ou enfrentar retaliações. “O pior pesadelo econômico da Europa se tornou realidade”, disse Carsten Brzeski, economista-chefe do banco holandês ING. Ele alertou que o cenário pode levar a Zona do Euro a “uma recessão total” no próximo ano.”
A eleição de Trump coloca a Europa diante de escolhas difíceis em todos os campos. Trump tem dito que a Ucrânia é um problema dos europeus e que os Estados Unidos não deveriam gastar o dinheiro do contribuinte americano com uma guerra que não lhes diz respeito. A perspectiva de a Ucrânia ter que ceder à Rússia parte de seu território como forma de conter o avanço russo e congelar o conflito já foi admitida publicamente pelo presidente ucraniano Volodymyr Zelensky nos últimos dias. Dos aliados europeus da Ucrânia, especialmente França, Alemanha e Polônia, resta saber o que farão. Vão aceitar a abordagem do novo governo Trump ou vão unir-se para preencher a lacuna deixada pelos Estados Unidos?
No comércio, as escolhas também não são simples. Diante da escalada protecionista de Trump que pode ferir de morte sua economia, os europeus vão resignar-se às novas imposições dos Estados Unidos, confrontá-las isoladamente ou fazer uma frente comum com a China? A presidente do Banco Central Europeu, Christiane Lagarde, já se adiantou ao sugerir que os europeus comprem mais dos Estados Unidos para evitar uma guerra comercial.
Segundo noticiou o Financial Times (28/11), “Christine Lagarde pediu aos líderes políticos da Europa que cooperem com Donald Trump sobre tarifas e comprem mais produtos fabricados nos EUA, alertando que uma guerra comercial amarga corre o risco de acabar com o crescimento econômico global. A chefe do Banco Central Europeu disse em sua primeira entrevista desde que Trump ganhou seu segundo mandato presidencial que a UE precisava “não retaliar, mas negociar” com um presidente eleito que ameaçou uma tarifa geral de até 20% sobre todas as importações norte-americanas não chinesas”.
Muito mais dependente do mercado norte-americano do que do mercado chinês, é pouco provável que a União Europeia vá fazer causa comum com a China para enfrentar a nova onda protecionista norte-americana. Segundo Cui Hongjian, importante pesquisador chinês em estudos europeus, ex-diplomata e chefe de estudos da União Europeia na Beijing Foreign Studies University em conversa com o South China Morning Post (25/11), “A União Europeia tentará encontrar um ponto em comum com os Estados Unidos para lidar com a China, mas Trump pode não necessariamente aceitar essa abordagem. Uma questão importante é que a Europa tem pouca influência sobre Trump. Se Trump impuser tarifas tanto à China quanto à UE, a UE pode tentar influenciar a equipe de Trump e desviar a atenção para a China, culpando o excesso de capacidade do país, assim como fez no primeiro mandato de Trump com as tarifas sobre aço e alumínio. Mas isso pode não funcionar, já que Trump expressou sua insatisfação com as importações de carros europeus dos EUA.”