A reação irada do chamado “mercado” à decisão da agência de classificação de riscos de elevar a nota de crédito soberano do Brasil, aproximando o país novamente do chamado “grau de investimento”, revela o quão pouco o pessoal que vive da especulação financeira se importa com o país. Segundo a taxonomia adotada pelas agências de risco, os países se dividem em duas categorias: grau de investimento ou grau de especulação. O grau de investimento funciona como um atestado de que o país não corre risco de dar calote em sua dívida soberana. Quando um país tem grau de investimento seus credores tendem a cobrar juros menores para emprestar para o governo, dada a maior segurança em receber o valor emprestado.
Já se o país é classificado como “grau de especulação” ocorre o oposto. Nesse caso, os credores cobram juros mais altos para emprestar e costumam investir em títulos soberanos desses países com o objetivo de especular, ou seja, fazer apostas mais arriscadas com o objetivo de obter ganhos extraordinários.
No caso dos Estados Unidos, considerado até pouco tempo o país de menor risco do mundo, os chamados Fundos Fed, ou seja, que comercializam os diversos títulos do Tesouro, estão pagando juros entre 4,75% e 5,25% ao ano para quem compre seus papeis. Já no Brasil, a taxa básica de juros, que remunera os títulos soberanos brasileiros, está em 11,75% depois do aumento de 0,25% na última reunião do Comitê de Política Monetária, formado pelos diretores do Banco Central.
Conforme informou o site do Ministério da Fazenda, “a agência de classificação de riscos Moody’s elevou a nota de crédito soberano do Brasil de Ba2 para Ba1, mantendo a perspectiva do rating Positiva. Essa revisão ocorre poucos meses após a agência ter atribuído a perspectiva positiva ao rating do país, em maio de 2024, o que reforça a tendência de melhora das notas de crédito, iniciada em 2023. O Brasil agora está a um passo do grau de investimento pela Moody’s. Em seu comunicado, a agência Moody’s menciona a melhora significativa no crédito do país, que se deve ao desempenho robusto do crescimento do PIB e o histórico recente de reformas econômicas e fiscais. Nesse contexto, a agência chama a atenção para a relevância do compromisso com as metas fiscais e com a trajetória de estabilização da dívida/PIB, considerando esses fatores fundamentais para a perspectiva positiva do novo rating.”
Para fazer essa melhora de classificação, a Moody’s está levando em conta não apenas as reformas aprovadas no atual governo, mas o conjunto de reformas que tiveram início no governo Temer, logo após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Não se trata, portanto, de um endosso ao governo Lula, mas a um conjunto mais amplo de reformas realizadas nos últimos anos, nomeadamente a reforma previdenciária, a reforma trabalhista, a reforma tributária e a reforma fiscal, com a introdução do teto de gastos.
Mas a má vontade da parte do chamado “mercado” em relação ao governo Lula é tamanha que não se conformam com melhora da classificação do risco soberano do Brasil pela agência, mesmo que isso seja o resultado de reformas pró-mercado aprovadas em governos anteriores. A maior parte dos analistas considerou precipitado o movimento da agência, mesmo frente aos números positivos mais recentes da economia.
Conforme destacou o jornal Valor Econômico (01/10/2024), “A agência premia um PIB claramente impulsionado por uma política fiscal materialmente expansionista e insustentável”, enfatiza o economista-chefe da ARX Investimentos, Gabriel Leal de Barros, para quem a decisão foi “incompreensível” e “muito controversa”, ao ir na direção oposta do consenso majoritário dos agentes de mercado. “A surpresa no crescimento, utilizada na argumentação, minimiza o efeito da política fiscal bastante expansionista praticada desde o choque da covid.”
Outras análises vão todas na mesma linha. Ao invés de comemorarem o fato de que uma melhora na classificação de risco é boa para o país, pois reduz o custo de rolagem de sua dívida e da captação de recursos externos para fechar o déficit na conta corrente do balanço de pagamentos, o que, em última instância, contribui para o equilíbrio fiscal, lamentam a decisão. Para quem vive da especulação financeira, manter o país em grau de especulação é a melhor estratégia.