O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin que, por força do cargo, preside, ao lado do vice-presidente chinês, Han Zheng, a COSBAN – Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação – esteve na China para participar da VII Sessão Plenária da COSBAN que aconteceu no dia 6 de junho em Pequim.
Conforme informa o site do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, a COSBAN, criada em 2004, no primeiro governo Lula, é o principal mecanismo de diálogo bilateral regular com a China e um dos mais amplos do Brasil com parceiros internacionais, coordenado pelo Ministério das Relações Exteriores. Participaram do evento representantes de 21 ministérios e agências governamentais brasileiras.
A COSBAN congrega onze subcomissões temáticas: Política; Econômico-Comercial e de Cooperação; Econômico-Financeira; Indústria, Tecnologia da Informação e Comunicação; Agricultura; Temas Sanitários e Fitossanitários; Energia e Mineração; Ciência, Tecnologia e Inovação; Cooperação Espacial; Cultura e Turismo; e Meio Ambiente e Mudança do Clima.
Ainda segundo o site, “Na ocasião, foram firmados 8 instrumentos intergovernamentais e anunciados 30 resultados, além de 11 atos do setor privado, nas áreas de agricultura, finanças, meio ambiente e mudança do clima, comércio, indústria, comunicação, saúde, educação, cultura, espaço exterior, energia, micro e pequenas empresas, desenvolvimento social e rural e ciência, tecnologia e inovação.”
O vice-presidente Geraldo Alckmin também se encontrou com o presidente Xi Jinping. Na ocasião, o presidente chinês afirmou que “Como países em desenvolvimento e importantes economias emergentes, os laços entre a China e o Brasil vão muito além das relações bilaterais e são um modelo para promover a solidariedade e a cooperação entre as nações em desenvolvimento, bem como para a paz e a estabilidade globais.” Alckmin, por seu turno, garantiu que o Brasil está disposto a receber mais empresas chinesas para investir no país, especialmente em áreas como infraestrutura, agricultura, mineração, veículos elétricos e combate às mudanças climáticas.
Na ocasião, Alckmin anunciou o investimento de 100 milhões de dólares da farmacêutica chinesa Sinovac no Brasil, para a produção de vacinas e o desenvolvimento de terapias celulares, e a assinatura, junto com a ex-presidente brasileira Dilma Rousseff, de um acordo com o Novo Banco de Desenvolvimento para que o banco apoie o estado brasileiro do Rio Grande do Sul com 491 milhões de dólares. Esse dinheiro será utilizado para reconstruir estradas, pontes e infraestruturas, naquele estado recentemente devastado por cheias devastadoras.
Essa visita se dá em um momento particularmente importante nas relações bilaterais entre os dois países. Afinal, comemoramos, em 2024, os cinquenta anos de relações diplomáticas entre Brasil e China. Ao longo desse período, as relações bilaterais entre os dois países ganharam amplitude e profundidade crescentes. O marco inicial da cooperação tecnológica entre Brasil e China foi o Acordo de Cooperação Cientifica e Tecnológica entre os dois países assinado em 25 de março de 1982. Em 1988 foi assinado o acordo para a construção conjunta de satélites de sensoriamento remoto conhecido como China-Brazil Earth Resource Satellite (CBERS) vigente até o hoje e que já permitiu o lançamento de vários satélites, sendo o último deles o CBERS 04A, em 20 de dezembro de 2019.
Em 1993, as relações bilaterais foram elevadas à condição de Parceria Estratégica. Em 2004, por ocasião da primeira visita do Presidente Lula à China, foi criada a COSBAN. Em 2010, foi assinado o Primeiro Plano de Ação Conjunta Brasil-China (2010 – 2014). Em 2012, as relações Brasil-China foram elevadas à condição de Parceria Estratégica Global e foi estabelecido o Diálogo Estratégico Global, em nível de chanceleres. Também em 2012, foi assinado o Plano Decenal de Cooperação para o período de 2012-2021. Em 2022, o Plano Estratégico 2022-2031 entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Popular da China foi endossado pela VI Sessão Plenária da COSBAN.
Embora as relações diplomáticas entre Brasil e China tenham sido estabelecidas em 1974, durante a presidência de Ernesto Geisel, as relações entre os dois países remontam a vários séculos. Ainda no período colonial o Brasil sofreu importante influência chinesa em sua formação social em Macau, que juntamente com o Brasil eram colônias portuguesas, a ponto de o sociólogo Gilberto Freyre ter cunhado o termo “China Tropical” para referir-se ao Brasil. Vários traços de nossa formação social e cultural nos séculos XVII e XVIII foram trazidos da China e de outros países da Ásia.
Em sua obra clássica Sobrados e Mucambos, Gilberto Freyre observa: “Pois o que parece é que, ao findar o século XVIII e ao principiar o século XIX, em nenhuma outra área americana o palanquim, a esteira, a quitanda, o chafariz, o fogo de vista, a telha côncava, o banguê, a rótula ou gelosia de madeira, o xale, o turbante de mulher, a casa caiada de branco ou pintada de cor viva e em forma de pagode, as pontas de beiral de telhado arrebitadas em cornos de lua, o azulejo, o coqueiro e mangueira alfenim, o arroz-doce com canela, o cravo das Molucas, a canela de Ceilão, a pimenta de Cochim, o chá da China, a cânfora de Bornéu, a fazenda e a louça da China e da Índia, os perfumes do Oriente, haviam se aclimatado com o mesmo à-vontade que no Brasil; e formado com valores indígenas o mesmo conjunto simbiótico de natureza e cultura que chegou a formar no nosso país. É como se ecologicamente nosso parentesco fosse antes com o Oriente do que com o Ocidente…”
O primeiro contato oficial do Brasil com a China se deu ainda no século XIX, durante o reinado de D. Pedro II. Como observam Marli Cristina Scomazzon e Jeff Franco, na obra “Primeira Circum-Navegação Brasileira e a Primeira Missão do Brasil à China (1879)”, “A Primeira Missão Oficial à China se deu simultaneamente à primeira viagem de circum-navegação de um navio brasileiro entre 1879 e 1881, refazendo o roteiro percorrido por Fernão de Magalhães em 1521.”
Conforme lembram os autores, “A viagem tinha dois objetivos. O primeiro era proporcionar “instrução profissional que se adquire nas viagens de longo curso” aos oficiais e marinheiros embarcados. O segundo era transportar uma missão diplomática brasileira à China, que ia buscar mão de obra chinesa para substituição do trabalho escravo no Brasil. Esta comitiva diplomática entrou no barco em Toulon, na França, e desembarcou em Hong Kong.”
Na mesma ocasião da visita do vice-Presidente Geraldo Alckmin à China, a ex-Presidente Dilma Rousseff, agora presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, também conhecido como Banco dos BRICS, deu longa entrevista ao jornal chinês Global Times (05/6/2024), na qual destaca aspectos importantes das relações atuais Brasil-China.
Na entrevista Dilma lembrou que China e Brasil se entendem em um mundo multipolar. “Temos muitos entendimentos comuns, por exemplo, em garantir um desenvolvimento que seja sustentável e proteja o clima, e um desenvolvimento centrado nas pessoas e contra as desigualdades. O mais importante neste momento é que nós [como países em desenvolvimento] podemos contribuir para a governança global e criar condições para a construção de uma comunidade com futuro partilhado.”
Lembrou também que, “Para a economia brasileira, a contribuição da China é muito importante, exemplificada pelas enormes importações pela China de produtos proteicos brasileiros, como carne bovina, de frango e suína, bem como pelo investimento chinês em setores como nova energia, produtos farmacêuticos, produção de vacinas e biotecnologia – entre outras – que facilitam o novo impulso de industrialização do Brasil.”
O jornal chinês Global Times, lembrou também que “A China se tornou o maior parceiro comercial do Brasil durante 15 anos consecutivos, e o Brasil é atualmente o nono maior parceiro comercial da China. No ano passado [2023], o comércio bilateral entre a China e o Brasil expandiu 6,1% em termos anuais, atingindo 181,5 bilhões de dólares, mostraram dados alfandegários. Espera-se que as exportações do Brasil para a China possam atingir US$ 103,4 bilhões até 2030, de acordo com um relatório do Conselho Empresarial China-Brasil.”
Em entrevista ao South China Morning Post (29/7/2024), de Hong Kong, o vice-presidente Geraldo Alckmin fez um balanço da viagem: “Garantimos R$ 24,6 bilhões (US$4,4 bilhões) em empréstimos para infraestrutura no Brasil, assinamos oito instrumentos intergovernamentais e anunciamos resultados importantes em acordos governamentais e do setor privado nas áreas de agricultura, finanças, meio ambiente e mudanças climáticas, comércio, indústria, comunicações, saúde, educação, cultura, espaço sideral, energia, micro e pequenas empresas, desenvolvimento social e rural, bem como ciência, tecnologia e inovação.”
O vice-presidente brasileiro destacou, ainda, que “assinamos um acordo para promover o café brasileiro com a maior rede chinesa de cafeterias, a Luckin Coffee. Isso prevê a compra de cerca de 120 mil toneladas de café brasileiro, no valor de cerca de US$ 500 milhões. O Banco Brasileiro de Desenvolvimento e o Fundo de Investimento em Cooperação Industrial China-LAC fecharam um acordo de cooperação que fornece acesso a até US$ 50 bilhões para infraestrutura. Também renovamos nosso foco no meio ambiente e nas mudanças climáticas, refletido na criação da 11ª subcomissão da COSBAN dedicada ao meio ambiente após a visita do presidente Lula a Pequim em 2023.”
Em outro trecho da entrevista, Alckmin destaca que “Entre outras coisas, foram aprovadas as normas sanitárias e de quarentena para a qualidade das nozes pecãs brasileiras. Isso significa que o Brasil poderá exportar nozes pecãs para a China. Fizemos progressos na abertura do mercado chinês para uvas e sementes de gergelim e anunciamos a próxima geração de satélites sino-brasileiros, CBERS-5, que serão geoestacionários.”